segunda-feira, 30 de março de 2015

Vida que passa

Apagou a vela com um sopro fraquinho.
Virou-se bem devagar para não fazer ranger a cama velha.
Encarou o mancebo com a manga de camisa pendurada que por tanto tempo lhe sugeriu um fantasma. Já não tinha medo.
Fechou os olhos.
Respirou acompanhando o caminho do ar até onde foi possível.
Pensou na última vez em que esteve na praia, pé descalço na areia quente.
Lembrou que a mãe sempre perguntava sobre a oração antes de dormir.
Mais uma vez desobedeceu.
Santo nenhum dava valor às suas rezas. Não acreditava muito e quando desesperou e rezou também não viu muita diferença.
As coisas passam porque passam.
As coisas acontecem porque tem que acontecer.
Não há mistério.
Não há filosofia.
Sentiu o gato pular no pé da cama.
O cachorro espiou, como sempre, desconfiado.
A vela ficou pela metade.
A cama não fez mais barulho.
A manga da camisa sentiu a leve brisa e balançou. Não seria a última vez, mas já não assustava ninguém.
Quanto tempo demorou a darem falta do Osvaldo ninguém soube contar.

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