quarta-feira, 21 de março de 2012

Testemunha

- a testemunha disse que não viu nada
- bom seu moço então não é testemunha...

- eu pensei em vir contar na hora o que eu vi naquela noite, mas não é muita coisa e daí eu fiquei com medo de incriminar alguém, mas agora estou arrependida, eu devia ter vindo

- ah, claro que eu vi... tava do outro lado da rua, mas eu enxergo muito bem - ela não parava de falar e foi aí que ele deu o primeiro tapa, nisso...

- atende essa campainha!!!
- psiu... não quero
- o que é?
- senhor, senhor, quero apenas apresentar a palavra de Jesus, sou uma testemunha de Jeová
- pois eu não quero saber disso não, eu não sou testemunha de nada, nunca me envolvi em nenhum crime, nem em política, passar bem e sorte pro seu réu

terça-feira, 20 de março de 2012

Vergonha de morrer

um corpo morto não controla emissão de gases
nem uma boca torta
nem uma palidez calcificante
tenho vergonha de morrer
vergonha de incomodar
vergonha de não estar pronta para ajudar
um corpo morto não controla o pé em ponta
nem a elegância do ombro aberto e para cima
por isso, tenho vergonha de morrer
não medo, medo eu não tenho
tenho só vergonha de não mais ser

quarta-feira, 7 de março de 2012

A menina e o relógio

Conheci uma menina, entre tantas meninas que conheci, que se divertia com suas histórias e que não se envergonhava de contá-las.
Uma menina de existência pesada, que ela tornava leve conforme transformava as histórias no clássico clichê seria trágico se não fosse cômico.
E me contava entre espantada e sorridente que muito, mas muito queria ganhar um relógio e não podia comprar.
De certa feita ganhou um, que às vezes funcionava, outras nem tanto, que não era moderno, mas também não era ultrapassado. Que era de segunda mão, não fora comprado pensando nela, mas que somando aqui subtraindo ali era um relógio e era dela.
E como era dela e era um relógio ela queria que todos vissem.
Voltando para casa em um sábado de noite quente, depois de uma festinha, percebeu um grupo de meninos, quase da mesma idade. Iam um pouco à frente e então apertou o passo e, ao passar por eles, repetidamente olhou para o relógio, levantando o pulso bem alto. E uma vez e outra. Exibindo sua preciosidade.
Mas o efeito foi bem outro...
Diante da insistência do gesto um dos garotos comentou:
- isso, rápido que o papai deve estar bem bravo com a filhinha atrasada...
Foi um balde de água fria. Vida cheia de clichês.
E re-encontro essa menina, bem passada dos trinta, que me conta histórias de sua existência leve, mas histórias que, por ora, não posso publicar!

terça-feira, 6 de março de 2012

Morro acima

morro acima mora a minha esperança
que é fé, já que aprendi que esperança
apenas se espera e que quando se tem fé
tudo se concretiza
a fé aperta meu coração
a esperança afrouxa a minha mão
tenho tantas tarefas aqui e acolá
mas gosto de descansar os meus olhos
nas nuvens brancas esparramadas pelo céu azul
e quando volto, tarde da tarde mas ainda
não de noite me distraio olhando a lua
e os morros recortados ao longe
eles nem sonham que estão gravados
em meus olhos e que guardam a minha
esperança
minha esperança mora morro acima
não morro antes de me encontrar
com ela e agradecer essa infinita
paciência de se apresentar e escapulir
e assim me fazer seguir e seguir
quando saí de casa de manhã
parei o carro meio sem jeito
na rua porque flagrei a minha gata
sendo apenas gata e explorando
muros e quintais vizinhos
parei e fotografei
morro acima despertava minha fé

sexta-feira, 2 de março de 2012

Desencanto

Inventou para si um passado tão cheio de detalhes que fechando os olhos quase pode reviver histórias que nunca aconteceram.
Adormece as vontades e em seu passado recriado foi cantora, conheceu pessoas e lugares sem nunca sair de seu quintal. 
Vive presa em seu presente miserável e sabe que terá que reinventar esses dias sem graça, mas não consegue se libertar.
Não consegue criar um futuro de presente e acredita piamente que vive o roteiro que o destino lhe escreveu.
Uma pena.


quinta-feira, 1 de março de 2012

Lurdinha

olhou pra Lurdinha e pensou que se soubesse fazer um poema talvez conseguisse namorar com ela,
desses namoros de ir no cinema, pegar na mão, comprar pipoca, dar um passeio, se vem um parque na cidade ganha um ursinho de pelúcia, desses namoros, simples, não de novela, com jóias e vinhos, não, desses de esperar no ponto de ônibus, pedir uma pizza no domingo pra família inteira, ficar no portão
mas ele não conseguia
tudo o que pensava quando olhava pra Lurdinha era que ela devia ter uns peitos lindos
e que aquelas pernas torneadas deviam terminar no paraíso e que quando ela vinha vindo ele já se preparava pra virar por que, ah por que
ele era um camarada muito do safado e desse jeito não ia
até aquele tonto do irmão do Jeremias estava namorando e ele nada, só sonhando com a Lurdinha
uma vez até tentou, mas precisou tomar um gole pra falar com ela quando ela saísse do trabalho, mas daí precisou tomar outro e mais outro e quando o supermercado fechou e a Lurdinha fechou o caixa ele já estava tão "engolado" que fez mais foi se esconder
olhou pra Lurdinha e pensou que se soubesse fazer um poema...
depois pensou que isso também podia não funcionar e resolveu deixar pra lá
se pelo menos ele fosse o dono da boca
e aí a mão coçou
mas também a Lurdinha não era pra isso tudo não, se desse uma cana matava a mãe do coração
olhou pra Lurdinha e pensou... tá tão calor, melhor tomar uma cerveja com o Zé e perguntar como foi que o jogo acabou

quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

Saudades

29 de fevereiro
marcadamente diferente
fevereiro era o último mês quando o ano começava em março e por isso ele é menor, com 28 dias, e por isso a cada quatro anos é dele a responsabilidade de restabelecer a ordem da translação da terra que leva 365 dias e quase 6 horas... para girar em torno do sol
já que não dava pra ter um dia de 6 horas (eu não me importaria!), a cada quatro anos um dia extra
ele deveria ser extra mesmo e poderíamos não fazer nada ou ter um desejo concedido
se eu pudesse ter um desejo concedido
teria gostado de ser uma menina de quatro anos voando pela primeira vez com meu pai
ele me explicaria tudo o que o avião fosse fazendo e enquanto o avião estivesse taxiando eu faria uma daquelas minhas observações:
- mas pai, o avião está andando, não está voando, o avião vai a pé?
29 de fevereiro
marcadamente igual
tenho saudades do meu pai sempre

terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

Pudim de Leite

O dia amanheceu endurecido
e ficou de cara amarrada em todas as horas
em que se viu escorrer pelo tempo.
Ter um tempo e não ter história para contar
é como ser uma ampulheta sem ter
areia colorida para fazer escorregar.
Sempre quis ter uma ampulheta.
Nunca comprei achando que alguém
ia achar que uma ampulheta era a minha
cara e por isso ia me presentear.
Há anos espero ganhar uma ampulheta.
Há coisas que eu ganho de mim mesma
quando canso de esperar,
mas uma ampulheta não é uma dessas coisas.
O dia tentou me alegrar.
De manhã o céu estava azul e as nuvens
brancas esparramadas por ele como se tivessem
sido frisadas.
Lindas e leves e nem assim eu me comovi.
Na hora do almoço um bando de bem-te-vis
escondeu-se em uma árvore na calçada
esburacada e fez uma linda cantoria
enquanto eu passava por ali.
E nada.
Meu coração não se encantou, apesar de
ensaiar um sorriso.
Há dias que apenas escorregam pelo calendário.
Hoje o dia amanheceu endurecido,
mas amanhã ele voltará como um pudim de leite...
sobremesa doce e macia depois de uma comida amarga.

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

Olhe para ela

Olhe para ela.
Nunca viveu um grande amor.
Casou, descasou.
Não teve filhos.
Nunca fez um boneco de neve.
Andou duas ou três vezes de avião.
A prima diria voou, não andou...
Olhe para ela.
Verões em praias medíocres.
Visitou uma caverna em excursão.
Rendeu graças em Nossa Senhora da Aparecida,
Mas também leu Chico Xavier.
Trabalhou arduamente em seus turnos regulares.
Nunca quis ser mais do que foi.
Nunca teve casacos de pura lã.
Olhe para ela.
Nunca apareceu em nenhuma revista.
Nunca tirou passaporte.
Nunca escreveu um poema.
Como cuidou do pai, depois da mãe,
incansável e sem nunca reclamar
Deus lhe deu como bônus morrer assim,
como um passarinho.
Deitou depois de rezar o terço e não acordou mais.
Foi a Maria que achou.
Olhe para ela.
Não sei por que, mas ainda assim acho que tem cara
de quem está sempre zombando de nós.

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

Olhar Periférico

Os cabelos pareciam o de um cantor de reggae e ele usava um macacão laranja, não por ser cool, mas porque prestava serviços para a prefeitura limpando o canteiro central da avenida movimentada.
Manhã cinzenta. Ele estava de costas, concentrado. Colorido.

Dobro a esquina e não passa das dez horas da manhã.
Enquanto livro o carro dos buracos da rua a cena entra em foco.
O casal toma uma cerveja no boteco da esquina.
Por um momento penso que estou na beira-mar. Por outro segundo verifico mesmo as horas.
Depois reconsidero pensando que estamos na sexta-feira da semana que fechou o carnaval.
E por fim me lembro de ter lido em algum lugar que o Mussum diria que você só é alcoólatra se bebe todo dia, se bebe toda a noite tá tranquilis. Perigoso.

Ela queria ter nascido com os olhos azuis e os cabelos longos e loiros.
O destino não se importa com nossos desejos mais íntimos e nos pare conforme ele mesmo desenha.
Mas ela, desafiadora, tingiu os fios sofridos da cor que bem entendeu.
Conversava com o possível príncipe encantado na calçada.
Não havia nenhum cavalo branco, apenas uma moto surrada, dessas que odiamos quando estão em movimento ameaçando a vida de nossos retrovisores.
Ela ria tímida enrolando a ponta dos cabelos nos dedos.
Namorico.

A vida vive ao nosso redor.
Eu presto atenção no farol, no buraco e no ciclista, mas as cenas do cotidiano invadem a minha visão periférica e abastecem a minha alma.


quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

Mãe não é tudo igual

Mãe não é tudo igual.
Mas, é mais fácil pensar que sim porque em agrupamentos tudo o que é bom sobressai e o que é ruim se dilui.
Mães se sentem com carta de alforria quando vão sozinhas à padaria pela primeira vez depois de parir.
E quando estão muito, mas muito cansadas, pedem pra alguém olhar o bebê um minutinho pra que vá ao banheiro e não quer fazer nada além de sentar e respirar por uns cinco minutos.
A hora do banho é sagrada.
Momento de re-encontrar o espírito.
Todos os olhos ficam voltados para as mães e delas se espera que sejam todas iguais. E perfeitas.
Eu não sou.
Eu perco a paciência.
Eu fico irritada com a lição de matemática.
Eu me canso de pedir sempre as mesmas coisas.
Eu quero ler sossegada.
Eu também quero comer bombom.
Eu quero comer uma pipoca inteira no cinema.
Mãe não é tudo igual.
Cada uma ama um amor único e diferente.
O amor é que é sublime e tenta nivelar quem pariu.
Mãe é igual quando sente culpa por cuidar de menos.
Mãe é igual quando sente vergonha de contar essas coisas que estou contando.
Mãe vem com DNA, digital, cada qual com seu sonho, absolutamente realizado nessas figurinhas.
Que de arte em arte nos transformam e nos melhoram.
Isso sim.
Nisso sim, somos iguais.

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

Coisas de vizinha

Ficou com medo das histórias que narrava depois que a Nazaré disse que quando se conta histórias de mortos eles voltam ou, se ainda não foram, não vão nunca mais.

Depois refletiu e ficou achando que a Nazaré tinha é inveja dela que tinha histórias para contar de gente que tinha gostado.

Andou um tempo amuada, contava casos de flores e riachos e até de pedras que tinha visto ou tido na infância e foi deixando os mortos de lado.
Quando esquecia lá vinha uma tia ou tio engraçado mas nunca sentiu o lençol levantar nos pés da cama.
Achou mesmo que era bobagem e decidiu que ia fazer um teste: se a Nazaré morresse antes dela ia contar histórias sobre ela todas as semanas.
As boas e as más.
De qualquer forma, quando rezava à noite sempre pedia vida longa à Nazaré.
Coisas de vizinha!

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

Dolores

Quando chovia, a única preocupação era saber se o gato estava abrigado dentro de casa.
Depois era verificar se nenhuma roupa sobrara no varal.
E então havia o ritual de olhar janela por janela se todas estavam bem fechadas.
Acendia as lâmpadas mesmo que estivesse claro para se certificar de que não faltaria energia.
Desligava da tomada todos os equipamentos elétricos.
Recolhia o tapete da varanda em caso de respingar.
Separava alguns vasos. Uns para tomar chuva outros para proteger dos pingos grossos.
Quando chovia, sentia-se renovada e ocupada.
Tão ocupada que quando a chuva passava voltava em seus passos refazendo tudo o que havia feito e, então, sentava-se na poltrona preferida para se lembrar de quando a casa era cheia de gente e de como foi se esvaziando com o tempo.
Quando chovia, ela achava que já estava pronta para morrer.

terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

Perigo Platônico

olhou para ela mais de uma vez
olhava sempre
de longe
de mais perto
um dia com os cabelos louros e longos soltos
em outro despenteados em uma trança rebelde
muitas vezes de jeans e camiseta
em poucas vezes de vestido
algumas outras de saia ou bermuda
sempre séria
seria ainda mais linda se sorrisse
os olhos claros como água de lagoa de filme
a boca tão bem desenhada
os pés bonitos
muitas vezes de tênis
em poucas vezes de salto
algumas outras de chinelo, sandálias de dedos
esmalte sempre clarinho
cordãozinho de ouro
brincos discretos
olhava para ela enquanto ouvia pelo rádio
o chefe anunciar uma nova instrução
tomava trem e ônibus para chegar ali,
vestir aquela roupa preta e ficar zanzando
de lá pra cá e dando informação
era um lugar seguro
ela nunca perguntara nada a ele, devia morar ali por perto
quem sabe dia desses ele não descobria?

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

Vida besta

cresceu em uma casa onde não se sonhava
não parecia haver um futuro diferente
e por isso foi apenas vivendo e ficando feliz
quando alguma coisa diferente, por mais simples
que fosse, acontecesse
e parecia que era sempre fruto do acaso
e por isso não rezou para nenhum deus
não traçou nenhuma meta,
não planejou nenhuma viagem,
não pensou em ser médico, astronauta,
nem mesmo bombeiro
cresceu em uma casa onde não se sonhava
não havia horizonte
e ninguém parava para admirar a lua
e por isso foi vivendo até que morreu
vida besta

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

Eu não sei

Eu não sei dirigir.
Eu não sei nadar.
Eu não sei andar de bicicleta.
Eu não sei andar de patins.
Eu não sei esquiar.
Eu não sei surfar.
Eu não sei mergulhar.
Eu não sei andar de skate.
Eu não sei andar de moto.
Eu não sei dançar.
Eu não sei virar cambalhota.
Eu não sei assoviar.
Eu não sei sambar.
Eu não sei cavalgar.
Mas, ser você sabe sorrir
por que isso deveria importar?

terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

Meus de amar

Caminho sob o sol do meio dia e do outro lado da calçada um pai jovem carrega a sua menina.
Uma menina que se minha mãe visse certamente diria: parece de folhinha! Eu digo que parece uma boneca.
Cabelos loiros, cacheados, bochecha rosada.
E nada mais é preciso do que o sol a pino e uma imagem tão singela para eu me lembrar de tardes mais amenas.
Tardes em que eu telefonava para casa avisando que estava de saída do escritório.
Tardes em que ainda ao longe, na calçada larga da parte bonita da avenida nove de julho eu vislumbrava um pai jovem e sua menina.
Vinham ao meu encontro.
E eram meus.
Não meus de ter, possuir, comprar e vender.
Meus apenas de amar.
Nem foi preciso fotografar esses encontros em tardes amenas. 
Tão vivos em meu coração.
Cenas de amar.
Quando olhamos para o nosso cotidiano enxergamos retratos de nossa história e nossa existência pode ser leve e feliz.
Meus de amar.

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

Roda gigante

cada um sabe em que roda gigante pode girar
quando estiver lá em cima pode gritar, erguer as mãos
olhar soberbo para baixo e, se cair, o tombo vai ser memorável
quando estiver cá embaixo é preciso paciência para esperar
a roda começar a se mexer e começar a subir
balança
às vezes dá até impressão de que a coisa emperrou
depois pega embalo e lá no alto é possível ver o céu mais de perto, de mais pertinho
mas, o céu é sempre o mesmo não importa a que distância
esteja o nosso olhar
cada um sabe em que roda gigante pode girar
saber sabe, mas quem é que decide a hora e a vez de cada um girar?

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

Rotina

se vai me dizer que não me ama mais
espera eu me sentar
se vai me dizer que quer ir embora
espera eu escrever meu número de telefone
num pedaço de papel
se vai me dizer que vai pedir uma pizza
espera eu tomar banho
se vai me dizer que vamos ver um filme
espera eu telefonar para minha mãe
se vai me dizer que esqueceu de pagar a conta de água
espera eu tomar um copo d'água
mas, se não vai me dizer nada,
para de me olhar desse jeito e me deixa
acabar de chegar
estou tão cansada que até piscar me dói

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

Remendos

Quanto mais modernos ficamos, mais remendamos coisas que apenas deveríamos amor ou, no mínimo, aceitar.
O lugar onde nascemos. Não decidimos. Mas, quando adultos vamos escarafunchar os nossos antepassados e reunir uma papelada infinita para conseguir um documento que nos dê um "pedigree" diferente.
E com isso remendamos nossa existência com nacionalidades que herdamos.
Não decidimos nascer meninos ou meninas. E isso também se muda. Anatomia, nomes e documentação.
Branco ou preto.
Coreano ou norueguês.
Também não decidimos, não que eu alcance nessa dimensão, quem serão nossos pais.
Se seremos único, do meio, o quarto, o quinto ou o caçula.
Não decidimos nascer em uma família de muitos primos ou de nenhum.
Mas, quanto mais modernos ficamos, mais remendamos nossos desígnios.
Quando fico cansada de remendar eu penso que seria tão mais simples apenas aceitar e não pensar mais no assunto.
Não escolhemos a cidade em que nascemos. Mas, podemos decidir em que cidade vamos morrer.
Não escolhemos o século em que nascemos. Mas, podemos escolher um ano e um dia para morrer, eu nem deveria lembrar dessa possibilidade porque nada há de mais triste do que não suportar-se a ponto de preferir "desexistir".
Remendos.
Os cabelos cacheados, alisamos.
Os lisos, encaracolamos.
Os olhos castanhos, azulamos.
Os olhos cinzas, esverdeamos.
A pele branca, bronzeamos.
O nariz, arrebitamos.
Muita coisa precisa mesmo ser feita. Ficamos mesmo mais bonitos.
Os dentes, clareamos.
Aqueles tortinhos, endireitamos.
Remendos.
Alguns tão bem feitos que mais parecem uma obra de arte.
Ajeitamos aqui, ajeitamos ali, mas tem uma coisa que de jeito nenhum se ajeita... a alma.
Ela só espia o que vamos pelo caminho remendando.

imagem Remendos em Branco
LARA ROSEIRO AZEITÃO, Lisboa, Portugal. Artista Plástica. Licenciada em Pintura pela ARCA/EUAC, Coimbra. Mestranda em Pintura na Faculdade de Belas Artes da Universidade de Lisboa.


quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

Destino de pomba

De nada adiantou que eu carregasse pendurado no pescoço a minúscula imagem de São Francisco em prata.
Morreu aos nossos pés. Enganada por si mesma. Pelas falsas imagens criadas. Por uma realidade inexistente.
Morreu nas mãos da moça que não hesitou em sair para socorrer.
Era uma pombinha do ar, que talvez por estar pensando na vida que teria se tudo fossem árvores e não prédios se iludiu com a vidraça e não mediu forças. Não teve tempo de entender e desviar.
Foi vista em seu último voo quase rasante por poucos, mas o barulho seco na vidraça foi ouvido por muitos.
Aos nossos pés. Olhos abertos e ainda vidrados.
A cabecinha inclinada como quem faz um cumprimento delicado, quase oriental.
Tínhamos tanto trabalho e éramos tão adultos que ninguém deixou escapar uma lágrima visível.
São Francisco, guarda a pombinha que se perdeu!
E cuida da rota das que ainda estão voando por aí!

terça-feira, 31 de janeiro de 2012

Atropelos

atropelo
um e sem chapéu para proteger-se de atropelo o verbo que pode machucar
que mal sabe o mau que bem não pode causar se tudo depender do bom
riquezas
relíquias
a moça que sorri não sabe bem onde fica o s do meu nome e nem como deve me chamar
não precisa
estou atenta e sei que é a minha vez
evito constranger
evito mau dizer
evito ser além do que esperam de mim para não ultrapassar nenhuma linha
para o bem ou para o mal
já sei me ser depois de tantos anos
já descobri que o que me agrada pode vir depois
sei quando estou sendo testada
tenho certeza quando estou testando
o lusco fusco das luzes artificiais, elas não almejam ser estrelas
a esperança é uma espera comprida
a fé é uma certeza curta que alcança mais longe
coisas que não sei explicar
só sentir
atropelo
janeiro já nos deixa
um doze avos
relíquias do tempo
é mais feliz quem ri sozinho ouvindo rádio
pescando um assunto aqui outro ali como o trecho em que alguém contava que o humorista americano dizia: quando eu era jovem o mar morto ainda estava doente
atropelos
a vida nos leva
e levamos a vida que o desassossego nos dá

segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

Hoje é dia da Saudade

Eu nunca soube que Saudade tinha um dia só para ela.
E hoje descobri que tem e que seu dia é hoje, 30 de janeiro. O motivo eu não sei.
O que sei é que muitos gostam de afirmar que saudade mesmo só existe em português, a palavra, não o sentimento. Mas não é bem assim, em galego também existe.
Para não deixar saudade nenhuma desamparada Michaelis conseguiu provar que os vocábulos langtan, do sueco e sehnsucht do alemão são a nossa saudade em português. A nossa é mais bonita e sonora, mas não solitária.
Sobre a origem há outra controvérsia.
Dizem que que vem do latim solitas, solitatis - "solidão", na forma arcaica de soedade, soidade e suidade e sob influência de saúde e saudar.

Mas, gosto mesmo do que nos ensina o professor Ragy: "em árabe há três expressões que lembram a palavra saudade: suad, saudá e suiadá. Tem o sentido moral de profunda tristeza e literalmente o sangue pisado e preto dentro do coração. Assaudá é uma doença do fígado que se revela pela tristeza amarga e melancolia. Os árabes dizem qualatni as asuiadá - "matou-me a saudade". E isto quando a pessoa entristece pela perda de um ente querido. E dizem igualmente al-mus-suad-dat - "os dias pesados e de tristeza".

Gosto dessa explicação, mesmo sem saber explicar.
E tenho saudades, muitas, de mim mesma, aquela que fui em alguns momentos.
Do velho Nicolino eternizado em meu coração, memória e dna.
Da minha mãe, que amo cada dia mais.
De um tempo que o tempo consumiu e de um tempo em que eu não sabia que Saudade tinha um dia só para ela.
Mas, para não entristecer, penso em coisas das quais eu não tenho saudade nenhuma e me divirto com meus pensamentos do avesso!

sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

Menino Percival

sentiu o cheiro da linguiça fritando, o gosto se previa meio rançoso, mas estar em casa...
estar em casa é ter um porto seguro, mesmo quando tem goteira
ter goteira é ter motivo pra subir no telhado, quando o céu abrir
e quando o céu abrir e o sol aparecer e ele subir no telhado pra consertar a goteira
estará feliz de ter uma casa pra morar,
um cheiro de comida pra sentir,
uma família pra cuidar
não esperava ter tudo isso
não imaginava uma vida além dos doze anos em que perambulou pelos orfanatos e
casa de gente pobre e safada que só tirava menino de lá pra trabalhar
mas tinha sobrevivido
tinha ultrapassado doze e depois mais doze e agora já não queria contar
quando abriu a porta o cheiro da linguiça fritando praticamente o abraçou
o menino agarrou na perna
o cachorro balançou o rabo
a mulher fez uma cara de quem não acha graça nessa bagunça, mas no fundo, no fundo
estava feliz que só
ser feliz é não ter dó de si mesmo e olhar cada pequena coisa como um gatilho pra um sorriso
ele bem poderia ser o autor da frase que diz:
tem gente que é tão pobre, mas tão pobre, que só tem dinheiro!

quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

Ontem, São Paulo

Ontem foi aniversário de São Paulo. Muita gente homenageou.
Li em algum lugar que é a cidade que os brasileiros amam odiar ou algo assim.
Eu digo há muito tempo que é a cidade feia mais linda do mundo.
A cidade de São Paulo recebeu, aceitou, confortou todas as personas que me habitaram.
Quando cheguei, a caipira que era e ainda sou, não se assombrou com os edifícios altos, mas ressentiu-se de encontrar céu tão cinza e entristecido.
Essa persona tinha 17 anos e só enxergava uma vida de coreografias, palcos iluminados, sapatilhas e máscaras que mais revelam que escondem.
Quando essa persona realizou que as luzes não brilhariam como tinha sonhado e buscou outros sonhos, São Paulo entendeu. No fundo, no fundo, magoou-se muito com a troca por Recife, mas nunca, jamais, negou seu abraço de volta e compreendeu que minhas personas podiam ir sem amarras nem rancores que voltariam sem explicação, sem necessidade de pedir perdão.
A persona que amadureceu. A persona que encontrou seu grande amor. A persona que acomodou em sua rotina o mundo business. A persona que gerou meninas em séculos diferentes.
São Paulo confortou cada uma delas.
Protegeu em suas garras.
Protestou silenciosamente durante declarações de amor que minha persona viajante já fizera à Nova York, Barcelona.
Eu não nasci aqui, eu não cresci aqui, eu não moro aqui, mas é aqui que eu sou e nos entendemos bem assim!

terça-feira, 24 de janeiro de 2012

Laís

No caminho de casa, ouço rádio e mal presto atenção à notícia, mas quando a repórter se anuncia, direto de Salvador, BA, ela diz seu nome e seu nome é Laís.

Laís é um nome marcante na minha vida.
Laís é o lindo nome da minha irmã caçula.
Laís é o nome que me fez pensar em nomes na vida.

Até então eu sabia os nomes do meu pai, da minha mãe, irmãs, irmão e avós e primos e nunca me atentei bem ao significado que um nome pode conferir a uma pessoa, à uma situação, a um destino, à uma vida.
Até então eu me chamava Lusia, mesmo nome de minha mãe, sem prestar atenção na diferença entre o S e Z que havia ente eles. Respondia por nenê ou por Lusiinha, como meu pai carinhosamente me chamava e mais não sabia além de que tinha sido um pedido de minha avó materna rendendo graças, uma vez mais, a inúmeras promessas que fizera para tentar salvar a visão de meu tio cego por toda sua existência.
Nunca um nome tinha me soado tão sonoro, tão bonito, tão angelical, tão forte, tão curto, tão cheio de personalidade.
Laís.
Confesso que queria arrancar dela esse nome e tomá-lo para mim.  

Ao longo da minha vida fui conhecendo outras moças de nome Laís.
Todas ímpares em suas singularidades e similaridades, mas nenhuma como a minha caçula.

Laís é um nome tão bonito e tão carregado de história que meus olhos ficam marejados.
Laís, a que tem popularidade. Denominação de uma antiga cidade longínqua, perto do rio Jordão é o que diz um desses dicionários de significados de nomes. Para mim, é apenas a minha caçula, guardada para sempre em meu coração.

segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

Coisas que eu perdi


De quando era criança não me lembro de nada que eu tenha perdido e que tenha se tornado uma perda enorme!
Eu me apiedo das coisas e fico pensando nelas que ficam pensando que eu as negligenciei e não é bem assim.
Perdi o escaravelho encrustrado em prata que Eunice, uma das mulheres mais elegantes que conheci, amiga de minha irmã mais velha, me trouxera de presente de uma das suas viagens de sonho.
Ele era incrível e eu lhe atribuí um caráter de sorte que durou pouco. Pendurado em um cordão vagabundo junto com tantos outros penduricalhos sem valor, ele se foi durante uma festa da minha juventude. Levou com ele uma gota dela.

Perdi a tiara que eu, caipira, chamava de "arquinho". De resina, com as cores do arco-iris, retorcida no alto, tão colorida e linda, tão importante para prender os meus cabelos longos e cacheados à custa de muito "permanente", que me dava o ar hippie de quem tem dezenove anos. O mar de Boa Viagem levou. Durante muitos dias eu vasculhei a areia na esperança de que tivesse me devolvido.

Perdi o meu anel de dezoito argolas de prata. Lúdico. Comprei outro igual. Encomendei, esperei, paguei, mas não é a mesma coisa. Em que dedo perambula ou em que canto escuro e improvável ainda espera que eu o encontre?

Coisas que eu perdi. Eu não me importo de liberar as coisas para terem uma vida melhor, roupas e calçados que não uso, bolsas que não cabem mais no espaço que tenho, relógios que não me agradam mais, objetos, brinquedos então... mesmo sendo das crianças, desapego. Mas quando as coisas se vão de mim, assim sem notícias nem preparação, ah eu me entristeço e não me esqueço jamais! É um jeito, o meu jeito, de olhar pra trás.

sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

A quem devemos

Aspiramos ser mais magras ou mais gordas.
Mais musculosas, mais flexíveis.
Aspiramos ter os cabelos lisos e longos, ou cacheados de comercial de produto para cachos.
Aspiramos ter os cabelos negros como o dos japoneses ou loiros como tantos noruegueses.
Aspiramos ter os dedos longos para tocar piano.
Aspiramos ter pernas longas para ser velocista, saltador.
Aspiramos ter ombros largos para atravessarmos a piscina com braçadas sem esforço.
Aspiramos os olhos azuis.
Aspiramos os lábios grossos.
Aspiramos a pele morena ou a pele branca como branca de neve.
E porque aspiramos, cada qual sua própria aspiração, recorremos a incontáveis senhores e doutores, incluindo aquele que nos conserta os dentes e os deixam com brancura total.
Médico disso e daquilo.
Salão disso e daquilo. Aqui e acolá.
Produtos incontáveis. Sonhos imponderáveis.
Enquanto isso ela descansa em sua concretude e ninguém para ela acende uma vela.
A senhora genética reina e não abre exceção sem muita, mas muita negociação.
Ela reina suprema enquanto nos debatemos com seus desígnios.
Eu rendo graças a ela e, preguiçosa que sou, ando animada usando um protetor solar anti-aging. Até quando? Não tenho rituais.
Ela até tolera os desafiantes, mas nunca, jamais os arrogantes!

quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

Minha pequena pequena

minha pequena me acompanha enquanto eu acompanho um grupo online
quer conversar
quando termino eu digo: agora vou aproveitar e fazer meu post, sobre o que posso escrever? faz uma poesia... e ela me diz
- sou péssima em poesia
- e em que você é boa?
- em falar sobre animais, lebres, camundongos, por que não escreve sobre mim? assim posso ficar famosa, quantos seguidores você tem?

e fico pensando que esse mundo que habito hoje se diverte comigo que conheci telex e fiz curso de datilografia

a minha caçula ouve falar sobre isso porque eu falo muito e sobre todo tipo de assunto e pronto
ela é linda - e eu sou a mãe dela, e pronto de novo, já está contaminado
ela é inteligente e me diz que gosta da frase: uivando para uma lua de concreto, que ouviu em um episódio de Simpsons
pronto, ela não tem idade para ver Simpsons, mas em compensação não vê novelas, empatei com os pedagogos!
ela é meiga
ela tem um jeito especial de olhar quando está em apuros que nenhum apuro sobrevive e as broncas perdem as forças
a minha caçula aperta as mãos unidas de um jeito que só ela
tem o cabelo de uma cor dourada que é só dela
ela me espera terminar de trabalhar
meus dias úteis são longos,
mas seriam inúteis se eu não tivesse essa pequena para amar

quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

Turbulência

tracei minha rota
tracei minha reta
as palavras que não disse e era a hora certa
as palavras que disse na hora errada
leio os letreiros amarelos que me avisam
para tomar cuidado com colisão traseira
e que no próximo painel ainda me lembra
de dirigir mais devagar com chuva
chove com vontade
chove decididamente
a chuva não tem medo de cair
esparrama pingos grossos pelo chão
pelos vidros que me cercam, mas não me enquadram
nunca me senti enquadrada
sempre desajeitada
deslocada
sempre mais de mim em lugares pequenos
sempre me sobrei apesar da minha miudeza
mas tracei a minha rota
tracei a minha reta torta
o gesto que não fiz
mas o olhar que me escapuliu e todo mundo viu
chove na minha estrada seca
leio os letreiros e as palavras piscam para mim
estamos aqui e não estamos nem aí
para os seus poemas esfarrapados
sem rimas nem versos
sigo meu caminho, não me importo com esses arroubos
as palavras gostam de dançar, mas são indomáveis
na maioria das vezes

terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Antagonista

Chegou em casa esbaforida e sem palavras.
Sentou depois de beber um copo de água gelada.
Prendeu os cabelos.
Primeiro ia descansar e recuperar o fôlego, depois ia procurar o significado daquilo.
Antagonista de si mesma.
Que diabo seria isso?
Não queria parecer ignorante, mas ele dizia coisas que ela não alcançava!
Não ia dar certo, ela tinha que desistir logo.
Se a mãe sonhasse, estaria perdida.
Ele era o filho da patroa. Ela era a filha da empregada e ponto final.
E não é como nas novelas, a coisa é séria, ninguém quer saber desse tipo de casal, nem a mãe dela e nem a mãe dele. E já começava com essa história dele segurar suas mãos e dizer:
- não tenha medo, não seja antagonista de si mesma!
Será que era inimiga?
Parecia ser. Ela queria desistir logo, acabar com essa loucura de namorar o filho da dona Gisele.
- Já chegou?
- Oi mãe...
- No que tá pensando?
- Em uma palavra nova que ouvi e preciso criar coragem pra ir pesquisar no dicionário
- Ah, não vou nem perguntar qual é porque minha cabeça não dá pra mais nada!
Foi desmanchando o sorriso que inventara para receber a mãe.
Foi recolhendo a mão que ainda segurava o copo.
Foi se conformando com a vida sem graça.
Antagonista de si mesma, pois sim, ser ela é que eram elas! Diria a avó se não tivesse morrido.

segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

História de Ano Novo

Eu quase não gosto do burburinho de final de ano.
Fico com a impressão de que todas as pessoas são mais boazinhas do que eu. Fico com a impressão de que todas as pessoas tem listas lindas de resoluções, não eu. Toda gente consegue organizar as compras de natal e resolver o que vão fazer melhor do que eu. Fico com a impressão de que as pessoas conseguem comprar presentes para todo mundo que gostaria de presentear e eu não.
Daí as pessoas andam alucinadas pelas ruas e pelos shoppings e tenho a impressão de que elas só estão me atrapalhando.
Meu espírito de natal se ausenta, eu não fico comovida com os enfeites das instituições financeiras porque acho que são meus juros que estão pagando aquilo tudo e acho hipócritas as pessoas que mal nos olham nos olhos e de repente, por alguns poucos dias, se comportam como se tudo fosse lindo. Linho e veludo vermelho.
Por tudo isso eu quase não gosto do burburinho de final de ano.
Mas agora passou.
2012 tem muitas coisas que eu gosto e por isso acho que ele vai ser fantástico. Dia a dia, um passo de cada vez.
Não gosto muito de números pares por isso prefiro somar 2 + 1 + 2 e então para mim é um ano ímpar.
Gosto.
É ano bissexto, adoro!
Começou chovendo. Fascinante.
Sempre que chove alguma coisa boa acontece comigo.
Quando chove parece que minha alma se ilumina com um solzinho que ela tem só para ela e por mais triste que pareça um dia chuvoso, normalmente estou mais sorridente. E gosto do sol, mas eu e a chuva temos uma coisa de pele. Dessas coisas que não se explicam.
Eu prometi para mim que escreveria em meu blog em todos os dias úteis.
Já voltei a trabalhar, já cuidei de IPVA, médico e escola das meninas, mas as minhas palavras ainda estavam em férias.
Vão voltando aos poucos. Nem todas de uma vez.
A coreografia ainda está sendo rascunhada. Estava preguiçosa das entrelinhas e resolvi não me pressionar.
Hoje começa meu ano de compromisso comigo mesma. Sem listas de resoluções, sem nada para provar.
Estou chovendo esse texto para bem dizer um ano que será ímpar.
E será se eu souber que além das novas coreografias eu ainda preciso cuidar muito do dois pra lá, dois cá!