Sol de tarde de inverno, quase aquece e quase ofusca a visão quando nos encara de frente na estrada.
Caminho modorrento.
Sem razão.
Caminho tranquilo e de velocidade cada vez mais reduzida pelas obras.
Obras sem arte, obras de descarte, sucessivas, invasivas.
O rádio ligado não me deixa pensar.
O caminhão do lado anda mais apressado sem carga, sem carroceria, só o cavalo pronto pra relinchar.
Buzina e quase me assusta, pra que buzinar? Estamos a trinta, quarenta quilômetros por hora.
E então percebo um caronista.
Um vôo leve denuncia sua presença.
Pousa quase na minha frente. Uma joaninha amarela.
Entre o universo do meu carro e a possibilidade de universo que vejo lá fora fico com essa segunda opção para orientar o futuro dela e abro a janela.
Nunca ando de janela aberta, mas tenho que permitir que ela ganhe o mundo.
Mas para minha surpresa ela pousa na janela ao meu lado e mais firme do que nunca se recusa a voar.
Como um cachorrinho que acaba de descobrir o prazer do vento na cara, ela parece acompanhar a paisagem.
Espio de rabo de olho esperando que se vá, esperando que a velocidade volte ao normal.
Nada. Nem uma coisa nem outra.
Penso que talvez tanto vento atrapalhe, subo um pouco o vidro.
Nada. Ela segue olhando a paisagem em seu posto de caronista privilegiada.
As sinalizações de obra vão ficando pra trás, o ritmo vai aumentando, fecho de vez a janela e sigo meu caminho.
Em casa, do carro para o dedo, do dedo para o jardim.
Uma joaninha amarela. Talvez um anjo da guarda. Talvez uma fada mirim.
Além das pessoas não tenho nada de muito precioso, mas sinto a vida que vive perto de mim.
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