Uma biografia não é feita só de histórias do bem. Nem só de histórias do mal.
Algumas são meio vexatórias, como diriam alguns. Mas, não posso faltar com a verdade.
Quando eu estava no primeiro ou segundo ano do colégio, já não me lembro mais, estudava à tarde, mas acordava bem cedo porque gostava de tomar café com o meu pai, que viajava muito e nem sempre estava em casa.
Ele ouvia no rádio um programa de músicas sertanejas. E até conhecia o locutor, o apresentador do programa.
Em uma cidade do tamanho de Tupã isso é fácil, mesmo na época em que não se conhecia a teoria de que podemos chegar a qualquer pessoa em seis passos.
Certa vez, nesse programa, houve um concurso cultural, desses que se vê até hoje. Você responde alguma pergunta através de carta e se sua carta for sorteada você retira um brinde.
Bom, o brinde da vez era um estojo escolar completo. Com lápis de cor, lápis, régua, borracha e eu fiquei enlouquecida para ganhar.
Escrevi a resposta em várias cartas e dizia meu pai que deixava lá na urna da rádio.
E ele sempre me dizia que era difícil ganhar, que eram muitas cartas, que o prêmio não era nada assim tão raro, que ele mesmo poderia comprar para mim um estojo novo, com todas aquelas coisas e que eu podia escolher a cor, o tipo de régua, a cor do apontador, etc e tal.
Qual nada, nada me convencia, eu estava muito empenhada e seguia escrevendo as cartas e ouvindo o sorteio e me angustiando com o fato de que dia após dia não ouvia o meu nome.
Para desespero do meu pai.
Na última semana do concurso, praticamente no último dia, estávamos tomando café e diferentemente dos outros dias em que meu pai sugeria que ouvíssemos notícias ou deixássemos o rádio desligado ele mesmo fez questão de deixar ligado no tal programa com o volume até mais alto do que o normal, para que de repente eu ouvisse:
- e o lindo estojo completo de hoje vai para... Lusia Nicolino! É, ela é a sortuda de hoje! É só passar aqui na rádio para retirar o seu lindo brinde que vai ser muito útil e blá blá blá.
Eu não me cabia de contentamento e no final da tarde fui com um dos meus irmãos até a rádio buscar o meu tão desejado brinde.
Lembro dele até hoje, um estojo de madeira, cheio de preciosidades, tão organizado, tudo tão novo!
Tempos mais tarde soube que meu pai falou com o locutor, contou da minha ansiedade e se propôs a comprar um estojo, com todas as coisas, para que me fosse entregue como se fosse o brinde da rádio. Ele recusou a proposta em termos, disse que não era preciso comprar um estojo, que ele “sortearia” o meu nome e assim foi.
As coisas que o meu pai fez por mim... deve ter sido muito difícil pra ele fazer esse pedido. Era tão rígido em seus preceitos, desde cinco e meia é cinco e meia e não cinco e trinta e cinco até uma moeda que era preciso voltar de troco.
Te echo de menos papa!
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