segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

O tamanho dos sonhos

Morava em uma cidade pequena, sem crimes, sem histórico de roubos e invasões domiciliares e por isso mesmo acordou assustado com um barulho na cozinha.
Levantou para se certificar de que um gato não ficara preso ou uma coruja talvez e, caso fosse um ladrão, não teria com o que se defender. Nem um bastão de beisebol como nos filmes americanos.
Mas foi. Em seu pijama improvisado, calção e camiseta de propaganda política.
Pé ante pé assomou à porta da cozinha e viu uma figura estranha tomando água direto na torneira da pia.
Não parecia ameaçador e apenas pigarreou para ser percebido.
A figura terminou de beber água, virou-se e sorriu.

- ah, olá, eu sou um gênio e estava buscando um camarada gente boa porque é a última vez que poderei conceder um pedido, um só, e depois serei recolhido ao mundo dos gênios que vai acabar essa história por aqui, portanto, vamos lá, capricha...

Pensou um pouco e disse:
- quero passear pela cidade e descobrir os sonhos das pessoas... o que cada uma delas mais deseja, nem preciso sair daqui, quero sentar, fechar os olhos e descobrir
- só isso?
- só, e nem precisa ser de todo mundo não, senão vou é ficar cansado
- tá bom, sente-se confortavelmente e feche os olhos, quando abrir eu não estarei mais aqui, divirta-se e obrigado pela água
Sentou-se no sofá. Apoiou a cabeça em uma almofada e os pés na mesinha de centro. Pareceria dormindo se fosse surpreendido por alguém.
...
- quero reformar a casa, por a porta do banheiro pra dentro, quando chove ou faz frio é um tormento!
- queria tanto que o João passasse no concurso público, teria emprego garantido, aposentadoria
- ai, bem que a Fabiana podia namorar o Carlos, filho do dono da farmácia, casava bem e o moço vive falando de mudar pra São Paulo
- se eu aprendesse a fazer crochet ia fazer uns tapetes lindos de barbante e mostrar pra Marinete que ela não é a única que sabe fazer coisas
- se sobrar um troco do décimo terceiro quero comprar a blusa vermelha! combina demais com a sandália preta
- não queria mais esse neném...
- queria ir na praia grande, todo mundo do colégio já foi
- se eu tivesse um carro podia chamar a Denise pra ir no baile comigo mas "de a pé"!

E foi navegando pelos desejos alheios. Sonhos tão pequenos. Desejos tão possíveis. Quase compreendeu porque o gênio fora recolhido para sempre em seu mundo e quando acordou considerou apenas que tivera um sonho esquisito.

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