segunda-feira, 11 de abril de 2011

Catarina

Estava sentada na sala esperando a neta sair do banho para trançar-lhe os cabelos.
Teve tempo para duas considerações.
A primeira de que o tempo passa, mas as meninas continuam as mesmas, esse culto aos cabelos longos, que são bonitos, claro, mas que tão tanto trabalho. Tão moderno os cabelos curtos! Mas um verdadeiro tabu naquela casa de mulheres!
A segunda é de que não conseguia deixar de se espantar com o fato de que sua filha, netas e genros chamavam aquele quadradinho de cimento, a sacada, de varanda!
Mal cabia um vaso acanhado de flor. Mas nem pensar em fazer ode às varandas de sua infância.
Amplas, com sombra fresca, flores subindo pelos pilares direto da terra, que vaso que nada, um ou outro com flor mais delicada. E cachorros e gatos dormindo na tarde quente, sons de crianças brincando no mormaço, vermelhas de alegria e calor.
- Pronto vó, começa daqui bem de cima pra ficar bem presa, tá bom?
- Tá bom! Mas que demora esse seu banho, hein? Não vai se atrasar?
- Não, eu falei pra minha mãe que era as três, mas de verdade será as quatro, sabe como ela é, atrasada!
- Sei.
- Dá tempo de você me contar uma história, de você pequena, me conta de novo do seu banheiro?
- Ah, mas você gosta de me fazer lembrar aquilo, que desconforto! E você acha engraçado?
- Não, não acho engraçado, acho difícil de acreditar.
- Pois quando eu era menina, o meu banheiro era uma casinha bem no fundo do quintal. Não tinha vaso sanitário. As pessoas faziam um poço bem fundo, faziam um piso de madeira, uma casinha mesmo, com um buraco e a gente fazia as necessidades ali. Tudo caía lá no poço.
- E você não tinha medo de cair também?
- Quando eu era bem pequena eu usava um piniquinho, depois minha mãe ia comigo, até que fui crescendo e comecei a ir sozinha, a gente vai se acostumando. Mas logo depois nos mudamos pra uma casa com banheiro e vaso sanitário e passou. Tudo passa, não é mesmo?
- É, tudo passa, mas eu espero que tudo passe pra melhor, que o meu passe para um banheiro maior, só para mim, não ao contrário.
- Acho que nem existe mais isso menina, não aqui na cidade, eu acho.
- Também não sei.
- Pronto, quase no fim, com o que vamos prender?
- Com esse elástico e depois você põe esse lacinho?
- Ponho, vai ficar linda! Não acha que no verão poderia cortar o cabelo? Depois ele cresce mais forte!
- Não vó, o meu tempo de ter cabelo comprido não vai passar tão rápido, sua espertinha!
- Pronto, está ainda mais bonita! Quem diria que sua mãe teria coragem de te dar meu nome, hein?
- Eu acho bonito vó, você não acha?
Fez que sim com a cabeça, as palavras ficaram enroscadas em um nó na garganta.

Um comentário:

  1. As histórias contadas por nossas avós são as melhores... e imbatíveis.

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