quinta-feira, 12 de março de 2009

Gosto de chuva

Gosto do verbo gostar, não gosto de sabor.
E gosto muito.
Claro que os dias ensolarados, de céu azul, são magníficos e também me enchem a alma, mas hoje quero contar que gosto de chuva, de céu carregado, de raios e trovões.
Sim, sei tudo o que causam, mas só quero falar que gosto de chuva.

Quando coisas boas acontecem na minha vida normalmente está chovendo.
Grandes notícias, grandes conquistas. E tem sido assim sempre.
Talvez porque eu tenha nascido em uma manhã linda, ensolarada, mas depois de uma noite chuvosa.
Nas últimas horas de conforto e segurança eu sabia que estava chovendo lá fora e ansiava pela coisa boa que era nascer!

Quando tinha lá os meus 9, 10 anos, eu protegia da chuva tudo o que havia no quintal.
Tudo mesmo, sem exageros. Pedaços de tijolos, velhas latas de tinta, cesto de lixo, vassoura sem cabo, bambu que sustentava a corda que era um varal.
Coisas óbvias que se encontram em quintais de casas do interior.
Já na chuva eu trabalhava como uma formiguinha incansável trazendo todo esse lixo, como dizia minha mãe, para o alpendre, a nossa área de serviço.
Muitas vezes minha mãe me ajudava porque em algum momento ela se convenceu de que não me convenceria.
Terminado o trabalho, suja, molhada, não importava, eu ia para o meu quarto e calçava meias limpas e vestia uma blusa quente, mesmo que fosse uma chuvarada de verão de quinze minutos e corria para a janela, espiar pelo vidro o fim da chuva que eu queria que não terminasse mais.
Disso também minha mãe se convenceu, de que não me convenceria de que era um absurdo vestir roupas limpas estando tão suja e de que não estava frio!

Quando tinha 18 anos eu atuava em uma peça de teatro chamada De Paletó e Pés no Chão, uma criação coletiva do Grupo Cio da Terra do qual eu fiz parte, do seu nascimento até o seu desaparecimento.
Um dia, após o espetáculo, estava no palco recolhendo algumas coisas e um senhor que estivera na platéia aproximou-se e me disse:

- quando fizer frio e chover, não procure um canto, vá para casa

Naquele momento não consegui entender o significado da frase. Nenhuma conexão com o conteúdo do espetáculo, mas absolutamente conectado com minha história com a chuva, que até então eu guardava escondidinha dentro de mim.
Usei essa reflexão muitas vezes. Antes de tomar algumas decisões importantes eu me lembro dessa frase.
Não sei quem era ele, que se afastou sem nada mais dizer e não falou com nenhuma outra pessoa.

Alguns anjos descem em missões especiais e eles podem vir sem as asas.
É, foi um anjo que choveu em minha vida.

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