segunda-feira, 24 de maio de 2010

Arte sutil

Permito-me um domingo preguiçoso, de acordar tarde.
Mas não passo incólume do que reaprendo no dia a dia das crianças de hoje.
Encontro a sala iluminada, com vida há muito tempo, uma desenhando mangás, a outra lendo a Recreio do último sábado.
Sorrisos abertos.
- Já tomamos café, eu esquentei salsichas! Diz do alto de seus dez anos a minha primogênita.
- É mesmo? No microondas?
- Não mãe, no fogão. São 3 minutos depois que a água ferve.
- E você sabe ligar o fogão? Eu já fiz perguntas mais inteligentes e ainda sou capaz de fazer, mas naquele momento, ainda estou sonolenta.
Ela me leva à cozinha e me apresenta o fogão e suas funções.
- Nesse botão você liga, nessas setas você controla a temperatura e, óbvio, que quando terminar precisa desligar, nesse mesmo botão de ligar. Jura que você não sabia?
- Não, não sabia. Mas que ótimo que você sabe.
Nunca ensinei minha mãe a usar o fogão a gás quando substituiu o fogão a lenha.
Agora os fogões se chamam cooktops, são elétricos, não precisa fogo, outros tempos, pensa o fogão a gás nos olhando de soslaio e pensando: espera até acabar a energia, quero ver onde há de aquecer suas salsichas!
Voltamos ao café da manhã. Nada que um pão com nutella não leve de volta à mesa duas meninas em fase de crescimento.
Continuo com preguiça e olhando a gata que pode ser preguiçosa sem remorsos penso alto:
- Eu já fui um gato na outra vida. Ao que a professora de cooktops responde sem modéstia:
- Eu fui Albert Einstein
Antes que eu pudesse discorrer sobre autocrítica, minha caçula dispara:
- e eu fui uma minhoca
A sutil arte da ironia.
Rimos e deixo a conversa correr solta.
Há coisas que não ensinamos. O que somos nos sai pela boca, pelos olhos, pela forma como acenamos, são coisas que não se ensinam. Lapida-se, mas não se ensina.

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