terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Destino retorcido

Estava sozinha quando eu entrei.
Quase bem cuidada.
Uma ou outra folha amarela, aceitaria água sem cerimônia, um calor típico de verão atípico de tão quente.
Vaso bonito.
Rodas de acrílico transparente indicando que ela não atrapalha a limpeza da sala.
Quase não nos falamos, mas pude perceber o seu constrangimento.
Parecia temer as perguntas que meus olhos formulavam:
- mas a quem parece bonito esse tronco submetido à tortura da trança?
- são três ou quatro mudas obrigadas a crescerem juntas, contrariando a natureza dos siameses que só almejam se separar?
- que dor é essa que deixa cicatriz quando os galhos que querem crescer precisam ser cortados para não atrapalhar a harmonia da obra?
Constrangedor olhar para ela com um misto de pena e admiração.
Já sem chance alguma de levar uma vida normal, crescer, abrir os galhos para me abraçar.
Não, a ela coube apenas o destino de ocupar um canto na sala desprovida de charme.
Uma mesa redonda, três cadeiras, dois quadros com fotos da construção branca de Carlos Paez Vilaro, Casa del Pueblo, em Punta del Leste. Já estive lá.
Mas nem a lembrança dessa viagem gostosa, nem  a conversa agradável conseguem desviar minha atenção do destino das coisas que, ainda que vivas, não podem se valer de humanidade.

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