Não tinha nada para fazer naquele sábado chuvoso, por isso resolveu arrumar gavetas.
As mais fáceis primeiro, as de meias, camisetas.
Depois as de documentos, contratos e contas. Bem mais trabalhosas, muito papel inútil, muita continha paga pro lixo.
Fez uma pausa e preparou um café.
A cozinha pequena, em ordem, tão pronta pra receber alguém. Quem?
Um café tão gostoso. Bem gostava de dividir com alguém e conversar sobre qualquer coisa.
Ia desistir de continuar arrumando gavetas.
Mas se deu conta de que todas as anteriores tinham sido arrumadas primeiro para postergar a vez daquela em que não queria mexer.
A gaveta das cartas e das fotografias.
Pensava separar umas de outras e depois ordenar as cartas por data. Talvez por remetentes? Não deveriam ser tantos assim.
E por último as fotografias.
Nada pode misturar de forma mais homogênea as lembranças boas e as doloridas do que um par de fotografias.
Rir das roupas e dos cortes de cabelo.
Buscar no olhar a presença da alma.
Apertar no peito um pedaço de papel e chorar sem pressa uma coisa que uns chamam de saudade, outros de dor, outros de ausência, mas que ela não sabia do que chamar.
Só sabia que tinha chegado a hora, tantas vezes adiada, de arrumar a gaveta de fotografias.
Dentro de pouco tempo não haverá mais gaveta de fotografias para ser arrumada. Quem sabe uma pasta de arquivos dentro de um HD cheio de outras pastas. As lembranças continuam sendo produzidas, sempre serão. Quanto à minha gaveta... esta continua assim, meio desarrumada, esperando um dia chuvoso.
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