quarta-feira, 24 de junho de 2009

Cristina

O dia começa e meu olhar parece programado para seguir a mesma trajetória.
Tela do celular para me certificar que é mesmo hora de abandonar o ninho. Janela do banheiro para decifrar a cor do céu.
Meninas prontas para a escola, um café reconfortante, a estrada e suas nuances diferentes a cada dia.
Hoje alguém conseguiu capotar um carro na Bandeirantes. Inusitado, mas não o primeiro dessa minha série de imprevistos. Nos acostumamos e preocupo-me mais em desviar e passar sem atrapalhar ainda mais o trânsito.
Reuniões, emails, telefonemas, papéis. O dia é atropelado por essa rotina.
Almoço fora, reunião fora, fez lição?
Caminho de volta. Crianças acordadas, tchau Rose, jantar e crianças na cama.
Ver um pouco de bobagem na tv enquanto alguém da familia ainda está em reunião em São Paulo.
Mas de repente, um chamado.
Presto mais atenção para ver de onde vem e lá está ela, no escuro, me espiando pela porta da sala.
Não ouso abrir, mas vou até a porta da cozinha e ela, ela chega primeiro que eu e tenta escapulir pela grade do portão.
Tenta mas não quer porque ao meu primeiro chamado volta feliz e se enrosca em minha perna.
Passo a mão em sua cabeça. Ela ronrona.
Abro o forno com cuidado e escolho um pedaço do frango ainda quentinho.
Agachada no quintal escuro vou oferecendo pequenos pedaços.
Seus olhos verdes me fitam. Sabe que estou quase dominada.
Digo que não posso ficar com ela e fecho a porta. Afinal, já está alimentada. Mas ela não vai embora. Continua me chamando.
A minha primogênita desce. Ai meu deus, já deveria estar dormindo! Conta-me que durante a tarde a gatinha brincou com ela no banco do jardim e que depois seguiu a nossa caçula até em casa. Fecho a porta da cozinha que dá acesso aos outros ambientes. O nosso whippet dorme enrolado em sua cama, o mais gato dos cães não se abala com nossa movimentação e continua dormindo todo coberto.
Abro uma vez mais a porta da cozinha. Ela entra confiante e explora cada canto. Ronrona, lambe a pata, me encara esperando um convite para ficar.
Eu a deixo ficar por alguns momentos. Ajeito uma toalha velha em um canto, mas fora da cozinha e fecho a porta uma vez mais, apago a luz, de novo criança na cama, eu no sofá folheando tantas revistas que ainda estão por ler.
E lá fora está ela. Ora na porta de cá, ora na porta de lá.
Por mim estaria aninhada em meu colo.
Tem cara de Cristina a gatinha que me escolheu. Onde posso me esconder, se seus olhos e seus chamados agora estão em mim?

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