quinta-feira, 25 de junho de 2009

Zé Paulo da moto

Esperou por ela na entrada da vila, em seu carro novo.
Novo para ele nunca significou carro zero. Um sonho muito distante.
Novo porque seu desde a última segunda-feira. Lataria por fazer, uma maçaneta enroscando, câmbio com jogo, mas tudo isso tudo bem, nada assim tão visível.
A cor não, a cor todo mundo via e não se convencia de que alguém em seu juízo perfeito poderia ter concebido e fabricado um carro azul carne estragada.
Mas não era ficção, ele estava bem ali. Perdido nesses pensamentos quando ela chegou.
Alegre, sorriso franco, um bom humor tirado não se sabe de onde.
Cheirosa. Cabelo arrumado. Batom brilhante. Brinco delicado.
Moça pra namorar. Moça pra casar.
Só por isso foi convencido a trocar a moto por esse carro.
A moto sim impunha respeito. A moto sim fazia com que se sentisse poderoso.
Com a moto voava pelos vãos das avenidas totalmente inserido no contexto.
Protetor, protegido, da turma, com assunto, com função, sem medo.
Foram para o bar onde toda a turma do bairro se encontrava.
Parou o carro longe, mais seguro, menos muvuca do que em frente ao bar, mais fácil de estacionar e tranquilo, lugar de casas, seguro mesmo. Medo de ser visto, mas ela não atinou.
Conversa de bar. Cerveja gelada. Provolone e salame. Conversa fiada, conversa animada.
Ninguém percebeu que ele estava cabisbaixo.
Nem mesmo ela.
Fim de noite. Ele cansado. Ela sorridente.
Parou o carro na entrada da vila. Ela o beijou, ele quase retribuiu.
Esperou que ela subisse a escadaria e mais uma vez comparou a moto com o carro azul carne estragada. Não.
Ninguém percebeu que ele não tinha a menor intenção de voltar.
O carro foi encontrado abandonado na M´Boi Mirim. Sem marcas de violência. Com a chave no contato. Um cheiro delicado de perfume.
Ele não. Ele nunca mais foi visto. Ele não era mesmo moço de se casar.

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