segunda-feira, 20 de julho de 2009

Pagar para ver

Isso às vezes pode significar "pagar mico".
E pagar mico tem uma classificação morfossintática: verbo infinitivo 1a pes singular ou 3a pes singular cujo sinônimo é envergonhar-se e uma palavra relacionada pode ser gafe.

Nasci teimosa, descrente, desconfiada, dona de minhas verdades, as quais minha sábia mãe não sucumbiu.

Com 8 anos de idade, nos meus primeiros anos de escola, a escola era tudo pra mim.
Arrumava minha bolsa, cheirava o material novo, pensava no lanche, ensaiava respostas para a professora, era um mundo tão sério para mim que dele eu não podia me ausentar um dia sequer.
Fizesse chuva, vento e tempestade ou sol. Estivesse com gripe, com dor de garganta e até com um pouco de febre, lá estava eu. Firme e forte.

E um belo dia, comecei a me arrumar e minha mãe se atreveu a me dizer:
- hoje não tem aula, é feriado!

- feriado de que? descrente

Infelizmente não me lembro a resposta, a data, mas foi categórica, segura.
Infelizmente não acreditei. E desfiei um rosário de explicações:

- como? se não veio nenhum aviso? se a professora não comentou? se nem um amigo falou? se não estou vendo todo mundo em casa? se a cidade não está com cara de festa? se não fiz traços verde e amarelo no caderno?

E fui por aí. Minha mãe respondendo sem se impacientar cada um dos meus argumentos até que deu de ombros e me disse:

- bom, se não acredita em mim, vai para a escola, pode ir

Pois eu me arrumei e fui até a escola. Chamava-se Bartira (lembra alguma coisa? Tupã, índio...) e ficava na praça central da cidade de Tupã, ao lado da Igreja Matriz. Era longe da minha casa, mas naquela época íamos sozinhos ou em pequenos grupos, despreocupados de barbaridades atuais.

Cheguei na escola pontualmente mas o portão estava fechado e não havia viva alma por ali.
Minhas têmporas formigaram. Isso acontece até hoje.
Um misto de raiva por não estar certa e muita, mas muita vergonha de imaginar que todo mundo que me tivesse visto de uniforme e material escolar estivesse rindo de mim.

Voltei por um caminho alternativo, mais longo, mas com casas mais silenciosas, nenhum comércio.
Lembro que encontrei um sorveteiro e comprei um picolé.
Um verdadeiro oásis naquela tarde de sol escaldante.
Ele não perguntou nada e eu quis terminar logo, escolher, pagar, fugir.

Em casa, tirei o uniforme e fui brincar. Minha mãe me olhou silenciosa e não foi preciso uma única palavra para que eu aprendesse a lição.

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