E talvez por isso eu me pergunto: quem são os caronas que dormem nos carros dirigidos por outrem?
Faço um longo trajeto e não posso deixar de observar um motorista entediado, com olhar fixo na frente, mas que nem sempre é atenção, é pura falta de opção.
O carona dorme em poses variadas.
Muitos com fones de ouvidos. Outros com a cabeça apoiada no vidro, a boca amassada sorrindo torto para mim.
Travesseiros improvisados. Óculos escuros ocultando a pestana caída.
Eu teria tanto assunto! Reformaria uma casa inteira.
Discutiria a última rodada do campeonato.
Pensaria em nomes para a reinauguração da farmácia.
Contaria uma tirinha do Calvin. Pensaria na próxima produção de Garfield.
Listaria alguns livros que ainda não li.
Contaria um causo da minha infância.
E faria perguntas, claro. Não estamos falando de um monólogo.
E observaria as respostas do interlocutor conforme o assunto. E mudaria de tema se não tivesse eco e aprofundaria o tema se percebesse entusiasmo.
Mas jamais dormiria enquanto alguém dirige para mim, por mim, comigo no carro.
Apesar de conhecer gente que paga para o carona ficar calado.
É, isso dá outro texto.
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