quarta-feira, 7 de abril de 2010

Vida besta

Carregava o mundo nas costas.
A mãe doente, resmungona.
O irmão mais velho, alto executivo, aparecia no Natal por obrigação, não para a ceia, no meio da tarde, um beijo, uns presentes comprados pela secretária.
O pai já se fora. Ele sim saberia lhe contar uma anedota e tornar tudo mais leve.
A vizinha implicava com as flores que ela tinha no parapeito da janela. Folhas secas sujam quintais.
O filho, um adolescente estudioso, trabalhador, tão calado que nem se deu conta de quando a voz de menino engrossou.
A irmã, no terceiro marido e de cabelos de cor indecifrável, sempre alegre, sempre sem problemas, sempre de bom humor e por isso sempre sem nenhuma responsabilidade sobre nada.
Os sobrinhos gêmeos do segundo marido, mais na casa da avó paterna do que em qualquer parte.
Carregava o mundo nas costas.
O marido? Ah sim, um motorista de caminhão, braço tatuado: amor de mãe, amor eterno.
Não é preciso nenhuma outra explicação.
Carregava o mundo nas costas. O viralata de nome Simpático o único que lhe fazia festas.
Planejara muitas vezes juntar umas roupas numa sacolinha de supermercado e deixar que a vida a encontrasse em algum lugar.
Mas nunca teve coragem nem de contar que juntava moedas do troco da feira para comprar coisinhas de mulher: uma calcinha nova, um batom.
Onde descarregar o mundo?

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