segunda-feira, 13 de setembro de 2010

Promessa

Não acreditava nos santos, mas estava tão precisada.
Quando era pequena a mãe a obrigava a ajoelhar e rezar.
Ela fazia isso, mexia os lábios, fechava os olhos e era salva por esse ritual porque a mãe nunca tomou as orações como tomava a tabuada.
O menino Jesus ela sabia que tinha nascido na manjedoura, fugido nos braços da mãe não sabia bem de quem e depois de moço apareceu fazendo milagre.
Ela via todas as imagens na igreja quando ia à missa com a mãe, mas era tudo tão desinteressante.
Umas orações compridas, uma sequência sempre igual de senta, levanta, ergue as mãos pro céu e depois, em fila, comungavam.
Ela tinha feito a primeira comunhão, mas não podia mais receber a hóstia porque já não se confessava há tanto tempo.
A mãe era rígida, mas com tanta preocupação, mais valia que a menina fosse bem na escola pra ter uma boa profissão ou casar com um homem de bem e seguir seu destino.
Não acreditava muito em nada não porque a mãe tão rezadeira, a avó então, nem se fala, e o que tinha dado certo na vida?
Aquela rotina de trabalho todos os dias, aquela casa pobre, aquela comida que não faltava, mas também não fartava, uma novela no fim da noite?
Que santo ajuda a mudar isso? Tem santo pra tudo, na certo a mãe sabia, nunca pediu nada não?
Pra não incomodar o santo, porque aceitava a dureza da vida ou porque não queria se decepcionar?
Ela tava tão precisada que tinha que arriscar. Tinha que fazer uma promessa.
Primeiro precisava descobrir um santo que pudesse ajudar. Santo Antonio era casamenteiro, São Francisco protetor dos animais, São Jorge lutava com um dragão, mas cá embaixo não sabia contra o que lutava não.
Perguntar pra mãe assim como quem não quer nada que na Bíblia devia ser bem difícil de achar.
Devia era ter um guia de santo, aí procurava pelo problema, achava o dito cujo e fazia a promessa.
Outra coisa difícil porque promessa sem sacrifício não serve pra nada.
A Marlene tinha contado que uma vez fez uma promessa e já começou a cumprir antes da graça alcançada e aí não deu certo. O certo mesmo é pedir, quando a encomenda chegar, começa o pagamento. Ai meu deus, tava tão precisada.
Se fosse falar com o padre talvez desse mais certo porque ele podia explicar tudo direitinho e até indicava o santo. Mas e a vergonha? O medo do sermão que ia ter que ouvir antes do padre? Compensava não.
E se a promessa fosse confessar, falar com o padre, explicar tudo e ir à missa todo domingo, já começando agora?
Podia escolher um santo preocupado com alimentos, aí escolhia a fruta que mais gostava, a carne que mais gostava e o doce que mais gostava e prometia não comer nenhum durante um ano. Cosme e Damião gostavam de doces, mas eram santos? Santo em dupla?
Melhor mesmo era perguntar pra vó, além de explicar ela ia esquecer antes mesmo de contar pra mãe.
É isso. Falar com avó e arriscar.

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