sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Pipas

As pequenas delícias fazem a felicidade maior.
Mas porque são pequenas não prestamos atenção.
Quando não as temos mais, nos sentimos desamparados.
Amoras no pé.
Amoras no chão.
E o que é uma fileira de amoras no jardim da frente da casa?
Um teatro, são formigas vindas da Malásia para uma grande apresentação!
Formigas que sofreram mutação.
Formigas que vão tingir nosso mundo sem graça com sua cor penetrante.
De tal sorte que quando mancha a camiseta nova, a mãe fica brava, muito brava. Já farta de tanta explicação.
E o que é um lençol secando no varal senão uma grande cortina atrás da qual se pode ficar escondida do joelho para cima.
Carinhas desenhadas nos joelhos direito e esquerdo podem ser personagens que contam uma história para uma platéia de irmãs caçulas.
E o que são dois tijolos se não a marca de um gol?
E o que é uma pastilha amarela de revestimento senão uma pedrinha de amarelinha guardada a sete chaves como se fosse uma relíquia, porque na hora do jogo, ah, não é necessário procurar um caquinho qualquer!
E o que são as mangas ainda verdes transformadas em mercadoria no armazém montado em cima de baldes e bacias?
E um talo de folha de mamona? O que é senão um canudo por onde se faz imprevisíveis bolhas de sabão com a água que a mãe prepara para deixar a roupa de molho?
São momentos em que não pensamos no que o futuro nos reserva, no que seremos, no que nos tornaremos.
Apenas somos, e quando apenas somos, todo o universo dá graças e a existência fica bem mais leve.
Será que ainda sei empinar pipa? Não custa tentar.

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