segunda-feira, 9 de novembro de 2009

A blusa mais linda que eu já tive

Quando o meu irmão começou a trabalhar — não, não era treinee, naquela época não tinha isso lá no interior — trabalhava em uma fábrica de cadernos, o que para mim foi uma grande novidade! Ele era pouco mais que um menino, mas trabalhar era coisa de adulto, de homem!
Eu teria menos tempo para algumas coisas como balançar em seu braço em L (ele) não que ele fosse forte, eu é que era um cisco; ver e torcer em suas lutas com meu gato, como se fosse luta livre rolavam no chão e ele dizia: é a luta, é a luta... divertidíssimo!
Por outro lado ele teria menos tempo para se divertir me provocando.
Ele me chamava de desenho porque dizia que eu parecia um desenho animado e eu não podia tirar a sua razão, era magricela, sardenta, sem dente na frente, nariz grande. Muitas vezes eu o ouvia perguntar ao chegar em casa:
- mãe, cadê o desenho?
Eu ficava feliz da vida mas fazia cara de quem estava zangada com o apelido.
Ele me levava, aos domingos à tarde, à matine do cinema para ver Tarzan e me comprava Banda de abacaxi. A guloseima que eu buscaria se fosse o personagem de Muriel Barbery em A morte do gourmet. Tampouco se zangou comigo quando, em uma das vezes, tirei o papel de todas as balas e fiquei segurando-as na mão, para não perder nada do filme me enroscando com os papéis e foi uma meleca só! Não, ele não se zangava comigo.
Com seu trabalho não perdi nada disso, nem ele perdeu a chance de me provocar. Eu ganhava mais coisas isso sim. Balas Soft, um pacote inteiro só para mim.
- Desenho, não engole que essa bala é dura, dói a garganta!
Mas nada se compara ao dia em que pediu à minha mãe que me arrumasse porque iria me levar com ele à loja de roupas. Claro, trabalho, roupas de trabalho. Para mim era um passeio.
Não me lembro do que ele comprou para ele, mas para mim... Para mim comprou a blusa mais linda que eu já tive até hoje. Uma malha vermelha, de zíper, com capuz. Em um tempo em que minha mãe costurava minhas roupas ou decidia o que eu iria vestir e pronto. Mas ele não. Ele me deixou experimentar, escolher, me disse que era linda, que no inverno eu ia ficar bem quentinha.
Eu ainda posso sentir o cheiro da roupa nova, porque não era outra coisa além de um carinho que não envelheceu como ele e eu.

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