Carregava sempre consigo o bloco de anotações.
E anotava sutilezas.
O pedaço de uma música. Um pensamento que lhe ocorria.
O telefone de uma plaquinha indicando costureira.
O itinerário de um ônibus que talvez um dia pudesse precisar.
Números ao acaso para talvez um dia jogar na loteria.
Carregava sempre consigo uma caneta bic, azul, com a tampa impecavelmente lustrosa, sem nenhum sinal de dentada inquieta.
E com ela escrevia o pensamento do dia lido em um jornal popular qualquer.
Anotava o significado do nome. Às vezes o signo no horóscopo chinês.
Mas naquele dia teve que anotar a placa do carro que depois do barulho demorou um pouco para manobrar e sair de novo em alta velocidade.
A mão tremia. A caneta queria falhar.
As pessoas gritavam ordenando umas às outras que ajudassem, que acudissem, que telefonassem, mas ninguém se mexia.
Só a mão trêmula desenhava letras e números repetidamente mencionados para não esquecer.
E marca, e cor.
Nada mais se mexia.
Nunca imaginou que o bloco de anotações também serviria para isso.
Arrancou a página e entregou ao policial.
Na página que sobrou ainda se podia ler todos os dados, tão forte pressionou letras e números.
Passou a mão devagar. Alto relevo, baixa compreensão dos caminhos da vida e vice-versa.
Fez sinal para o Vila Mariana. Embarcou. Encontrou um banco no fundo.
Passou a mão devagar na folha em branco mais uma vez. Escreveu um trecho do Pai Nosso que mais que isso não sabia e guardou o bloco e a caneta no bolso, sutilmente.
sexta-feira, 29 de maio de 2009
quinta-feira, 28 de maio de 2009
Particularidades
Meu pai foi dirigindo o seu caminhãozinho, sozinho, da fazenda até a delegacia da cidade de Vera Cruz para tirar sua carteira de habilitação. Quando perguntado quem o tinha levado até lá, disse todo orgulhoso que já tinha ido dirigindo. Só não levou a primeira multa antes mesmo de receber a carteira porque era filho do Sr. Augusto.
Minha mãe tinha uma porquinha de estimação. Andava pela casa, tomada banho, como se fosse um cachorrinho. Brincava de esconde-esconde, ficava sempre atrás da porta da cozinha e quando minha mãe chamava Nininha, ela vinha correndo, mas acho que não balançava o rabinho de mola!
Minha irmã mais velha adorava os pintinhos amarelinhos que andavam pelo quintal da fazenda. Gostava tanto que pegava um em cada mão e apertava dizendo: ai que coisa mais linda! E soltava os pobrezinhos já sem vida. Não sei quantos foram.
Minha segunda irmã mais velha tinha medo dos porcos. Passava por eles pelo chiqueiro e choramingava dizendo que eles estavam fazendo "fusquinha" para ela entre o vão da cerca. Uma espécie de careta. Não era bem medo, no fundo ela achava que era pessoal, que os bichinhos não gostavam dela, que não queriam fazer amizade e por isso ela chorava sentida, apesar de toda paciente explicação da minha mãe.
O meu irmão, nascido e criado na fazenda, cercado de tanto gado leiteiro, era alérgico ao leite de vaca e meu pai o fotografou em frente a uma verdadeira pirâmide de latas de leite. Lá está ele, olhinhos curiosos, calção de pregas, camisa, todo alinhado para a foto. Não sei o que foi feito de tanta lata, mas elas foram parte da diversão e ele sobreviveu forte sem a contribuição das vaquinhas.
Depois dele foi quando eu cheguei. Não morávamos mais na fazenda. Mas ela vive em mim por DNA.
Minha irmã caçula, ainda mais citadina do que eu abusava de sua boniteza e todo dia, por volta das 4 horas da tarde dava um baile porque não queria tomar banho. Queria ficar descalça, com roupas leves, brincando na terra para sempre. A paciência de minha mãe só deu uma volta em uma dessas ocasiões, em que aquele bebe de quase dois anos lhe escapou do quarto, sem roupa, foi até o quintal, passou terra na barriga ainda meio molhada, voltou ao quarto e limpou-se na colcha da cama arrumada sem nenhuma preguinha. Foi o ato de protesto mais forte que já presenciei, eu não fui cara pintada.
Minha mãe tinha uma porquinha de estimação. Andava pela casa, tomada banho, como se fosse um cachorrinho. Brincava de esconde-esconde, ficava sempre atrás da porta da cozinha e quando minha mãe chamava Nininha, ela vinha correndo, mas acho que não balançava o rabinho de mola!
Minha irmã mais velha adorava os pintinhos amarelinhos que andavam pelo quintal da fazenda. Gostava tanto que pegava um em cada mão e apertava dizendo: ai que coisa mais linda! E soltava os pobrezinhos já sem vida. Não sei quantos foram.
Minha segunda irmã mais velha tinha medo dos porcos. Passava por eles pelo chiqueiro e choramingava dizendo que eles estavam fazendo "fusquinha" para ela entre o vão da cerca. Uma espécie de careta. Não era bem medo, no fundo ela achava que era pessoal, que os bichinhos não gostavam dela, que não queriam fazer amizade e por isso ela chorava sentida, apesar de toda paciente explicação da minha mãe.
O meu irmão, nascido e criado na fazenda, cercado de tanto gado leiteiro, era alérgico ao leite de vaca e meu pai o fotografou em frente a uma verdadeira pirâmide de latas de leite. Lá está ele, olhinhos curiosos, calção de pregas, camisa, todo alinhado para a foto. Não sei o que foi feito de tanta lata, mas elas foram parte da diversão e ele sobreviveu forte sem a contribuição das vaquinhas.
Depois dele foi quando eu cheguei. Não morávamos mais na fazenda. Mas ela vive em mim por DNA.
Minha irmã caçula, ainda mais citadina do que eu abusava de sua boniteza e todo dia, por volta das 4 horas da tarde dava um baile porque não queria tomar banho. Queria ficar descalça, com roupas leves, brincando na terra para sempre. A paciência de minha mãe só deu uma volta em uma dessas ocasiões, em que aquele bebe de quase dois anos lhe escapou do quarto, sem roupa, foi até o quintal, passou terra na barriga ainda meio molhada, voltou ao quarto e limpou-se na colcha da cama arrumada sem nenhuma preguinha. Foi o ato de protesto mais forte que já presenciei, eu não fui cara pintada.
quarta-feira, 27 de maio de 2009
É feio se assim lhe parece
O conceito de estética, de bonito e feio já foi tantas vezes discutido, tantas teses defendidas, tantos estudiosos, doutores que não me atrevo a racionalizar. Mas eu vejo o feio bonito da cidade de São Paulo e não é a primeira vez que falo sobre isso. Mas hoje descobri mais um detalhe.
São Paulo amanheceu com chuva.
Cinza sem contornos que deixa tudo sem relevo, ausência completa da sensação 3D. A Marginal Pinheiros é feia. Os carros em velocidade quase zero, primeira, segunda me deixam perceber o celta da nova skin, a kombi da granero. O vectra de Serra Negra leva no banco traseiro um menino tão bonito! Uns 5, 6 anos. Nariz empinado que tantos querem copiar em salas brancas de mesas assustadoras.
Mas a minha descoberta está no céu.
Nos postes que tiram a harmonia do Projeto Pomar, encarcerado por blocos de concreto.
Lá no alto, poste sim, poste não, estão os urubus.
Os urubus são feios. São feios mas são elegantes e hoje exibiram-se para mim em uma coreografia que eu poderia ter preparado.
No alto do poste, asas abertas, bico recurvo, encarando a lentidão abaixo.
Vôos coordenados. Pouso suave. Um bater de asas em camara lenta e em sequência, poste sim, poste não um a um e de repente um agrupamento de 3.
Enquanto conduzi meu carro dançaram para alegrar a minha manhã de compromisso perdido, rapidamente reagendado pelo celular.
Dançaram para me dizer que só é feio o que lhe parece feio. Eles estavam especialmente lindos, hoje, no meio da semana!
terça-feira, 26 de maio de 2009
Venâncio
Encostou no balcão, meio de lado, girando o copo transparente, com líquido transparente, perdido em seus pensamentos transparentes.
Como ainda estava em pé, depois de beber tanto, não sabia.
O bar cheirando fumaça e suor estava cheio de homens como ele. Quase como ele, porque estavam em pequenos grupos ou em dupla e todos tinham sobre o quê falar.
Ele não.
Ele apenas pensava. Sabia que o caminho para casa começaria quando ele desse o primeiro passo, mas a mão girava o copo e era só esse movimento que ele conseguia coordenar.
Todo o resto parecia apenas um grande vazio.
Os meses correram solto na folhinha que estava pendurada na cozinha. O enorme telefone do açougue desenhado logo abaixo da foto de uma montanha coberta de neve.
Por que um açougueiro decide estampar uma montanha coberta de neve para fazer você se lembrar que é lá que você tem que comprar os seus bifes, os seus miúdos, a sua costela?
Iria perguntar da próxima vez que fosse lá, mas agora, agora tinha apenas que encontrar forças para caminhar até em casa.
Encarar o olhar furioso da mulher que reclama apenas de tantas lavagens de lençol cheirando a álcool.
Talvez o pequeno ainda estivesse acordado e esse olhar sim era insuportável. Um misto de tristeza, angústia e medo.
Saiu caminhando depois de deixar o dinheiro amassado sobre o balcão. Fez apenas um gesto com a mão como quem diz obrigado, boa noite, até amanhã, tchau... um gesto de múltiplas palavras simples, que ele não sabe mais do que isso.
Pegou o rumo de casa tão sem rumo que quase chorou.
Toda noite, durante todo o trajeto jurava que era a última vez. Um dia acertaria.
A luz fraca do poste tinha preguiça de desenhar sua sombra e ele se contentava em ser apenas um borrão.
Passos sem ruído, o rangido do portão alivia o coração aflito da mulher, ainda está vivo.
Como ainda estava em pé, depois de beber tanto, não sabia.
O bar cheirando fumaça e suor estava cheio de homens como ele. Quase como ele, porque estavam em pequenos grupos ou em dupla e todos tinham sobre o quê falar.
Ele não.
Ele apenas pensava. Sabia que o caminho para casa começaria quando ele desse o primeiro passo, mas a mão girava o copo e era só esse movimento que ele conseguia coordenar.
Todo o resto parecia apenas um grande vazio.
Os meses correram solto na folhinha que estava pendurada na cozinha. O enorme telefone do açougue desenhado logo abaixo da foto de uma montanha coberta de neve.
Por que um açougueiro decide estampar uma montanha coberta de neve para fazer você se lembrar que é lá que você tem que comprar os seus bifes, os seus miúdos, a sua costela?
Iria perguntar da próxima vez que fosse lá, mas agora, agora tinha apenas que encontrar forças para caminhar até em casa.
Encarar o olhar furioso da mulher que reclama apenas de tantas lavagens de lençol cheirando a álcool.
Talvez o pequeno ainda estivesse acordado e esse olhar sim era insuportável. Um misto de tristeza, angústia e medo.
Saiu caminhando depois de deixar o dinheiro amassado sobre o balcão. Fez apenas um gesto com a mão como quem diz obrigado, boa noite, até amanhã, tchau... um gesto de múltiplas palavras simples, que ele não sabe mais do que isso.
Pegou o rumo de casa tão sem rumo que quase chorou.
Toda noite, durante todo o trajeto jurava que era a última vez. Um dia acertaria.
A luz fraca do poste tinha preguiça de desenhar sua sombra e ele se contentava em ser apenas um borrão.
Passos sem ruído, o rangido do portão alivia o coração aflito da mulher, ainda está vivo.
segunda-feira, 25 de maio de 2009
A ignorância é uma bênção!
Muitas vezes é preferível não saber certas coisas.
No mundo corporativo, por exemplo, você está alegre no café e alguém te chama meio de lado e pergunta:
- então, você foi convocado pra reunião do novo projeto?
- não, nem sabia do novo projeto...
Pode ser uma bênção! Muitas vezes é um projeto sem objetivo claro, sem líder, sem prazo para ter começo, meio e fim. Muitas vezes precisa de relatórios que não levam a nada e outras tantas vezes precisa de horas extras depois do expediente para discutir estratégias. Parece uma peça de teatro amador. Dois ou três falam e muitos figurantes tomam nota.
Mas nem tudo gira em torno de business.
Quando eu tinha 7 anos eu não sabia que existia um país chamado Arábia Saudita.
No meio do ano escolar entrou uma aluna nova na minha classe de primeiro ano e quando ela, a pedido da Dona Terezinha, se levantou para se apresentar e disse que se chamava Arábia Saudita eu achei o nome dela o mais lindo do mundo!
Sonoro, feminino, charmoso e não via a hora de voltar para casa e contar a novidade.
Diante da cara de espanto dos meus irmãos e da risada gostosa de um deles me explicando que era o nome de um país, eu não pensei naquela hora, mas penso agora: a ignorância é, de fato, uma bênção!
Saber do país acabou com a mágica do nome da menina franzina, tímida em suas tranças bem cuidadas.
Ela ficou conosco até o final do ano e se foi, não sei o que o pai fazia que se mudavam de lá para cá muitas vezes, conforme nos contou em um recreio. Nunca lhe perguntei porque lhe deram esse nome, mas podia ter dito que achara lindo, talvez fizesse diferença para ela.
Talvez quem o escolheu tenha sido apenas alguém com muita saudade de casa, ou alguém extravagante, ou ainda um ignorante completo mas, penso que em nenhum desses casos, haja bênção que lhe salve!
No mundo corporativo, por exemplo, você está alegre no café e alguém te chama meio de lado e pergunta:
- então, você foi convocado pra reunião do novo projeto?
- não, nem sabia do novo projeto...
Pode ser uma bênção! Muitas vezes é um projeto sem objetivo claro, sem líder, sem prazo para ter começo, meio e fim. Muitas vezes precisa de relatórios que não levam a nada e outras tantas vezes precisa de horas extras depois do expediente para discutir estratégias. Parece uma peça de teatro amador. Dois ou três falam e muitos figurantes tomam nota.
Mas nem tudo gira em torno de business.
Quando eu tinha 7 anos eu não sabia que existia um país chamado Arábia Saudita.
No meio do ano escolar entrou uma aluna nova na minha classe de primeiro ano e quando ela, a pedido da Dona Terezinha, se levantou para se apresentar e disse que se chamava Arábia Saudita eu achei o nome dela o mais lindo do mundo!
Sonoro, feminino, charmoso e não via a hora de voltar para casa e contar a novidade.
Diante da cara de espanto dos meus irmãos e da risada gostosa de um deles me explicando que era o nome de um país, eu não pensei naquela hora, mas penso agora: a ignorância é, de fato, uma bênção!
Saber do país acabou com a mágica do nome da menina franzina, tímida em suas tranças bem cuidadas.
Ela ficou conosco até o final do ano e se foi, não sei o que o pai fazia que se mudavam de lá para cá muitas vezes, conforme nos contou em um recreio. Nunca lhe perguntei porque lhe deram esse nome, mas podia ter dito que achara lindo, talvez fizesse diferença para ela.
Talvez quem o escolheu tenha sido apenas alguém com muita saudade de casa, ou alguém extravagante, ou ainda um ignorante completo mas, penso que em nenhum desses casos, haja bênção que lhe salve!
sexta-feira, 22 de maio de 2009
7 anos
Muitos dizem que sete é um número mágico. Eu gosto muito do número sem muitas explicações filosóficas, talvez porque antes mesmo de gostar do 7 eu gosto de números ímpares. É mais desafiador trabalhar com imperfeições.
Mas, quando eu tinha 7 anos esse número não me parecia nada mágico.
Eu parecia uma caricatura e meu irmão me chamava de desenho, em referência aos desenhos animados.
Eu tinha canelas muito finas e era alta para a minha idade.
Não tinha os dentes da frente. Tinha o cabelo curto parecendo um moleque e muita sarda no rosto.
Eu era feia. Ponto.
Por algum tempo eu achei que todo mundo que tinha 7 anos era assim porque meus amigos e amigas de rua não eram lá tão diferentes. Eu me esforçava para pensar assim, apesar da minha melhor amiga ser loira de olhos azuis, mas eu fingia não ver.
As coisas começaram a mudar rapidamente quando minha irmã caçula nasceu.
Eu me chamava e me chamo Lusia, um nome que hoje se encontrou com minha faixa etária, mas com 7 anos, era um nome de senhora e eu não gostava dele.
Minha irmã se chamou e se chama Laís. O nome mais lindo e sonoro e feminino do mundo.
Para ajudar a piorar era o bebe mais lindo que conheci naquela época e fiquei ainda mais feia me comparando a ela. Cabelo mais claro, pele mais morena, olhar profundo, bochecha que convidava aos apertões. Sorriso também banguela, mas nela até ser banguela era bonito!
Naquela época eu não pensei que era o máximo ter uma irmã caçula tão fofa e linda e querida por todos, eu apenas tinha ciúmes.
Na escola, outro capítulo. Todos tinham a mesma idade que eu e eram mais bonitos.
Com exceção de uma menina que se chamava Joana à qual me afeiçoei muito, todos eram mais bonitos.
Joana era a mais feia, a mais pobre, a que tinha mais problemas de aprendizado e talvez por isso eu tenha tido compaixão. Ou talvez, porque ela era a única que me mostrava que sim, que tudo podia ser pior.
Então, já que era assim e eu nada podia fazer decidi ser a melhor da classe. Para meu sofrimento solitário. Não era muito difícil, eu lia e escrevia bem, gostava de fazer a lição (tarefa!), prestava muita atenção, mas quase morri de chorar quando tirei 98 e não 100, mesmo o 98 tendo sido a nota mais alta da classe e tendo recebido parabéns da Dona Terezinha, minha primeira professora, porque não fiz pré, fui direto ao primeiro ano.
Quer sofrimento mais inútil do que esse?
Mas aos 7 anos eu ainda não sabia!
Mas, quando eu tinha 7 anos esse número não me parecia nada mágico.
Eu parecia uma caricatura e meu irmão me chamava de desenho, em referência aos desenhos animados.
Eu tinha canelas muito finas e era alta para a minha idade.
Não tinha os dentes da frente. Tinha o cabelo curto parecendo um moleque e muita sarda no rosto.
Eu era feia. Ponto.
Por algum tempo eu achei que todo mundo que tinha 7 anos era assim porque meus amigos e amigas de rua não eram lá tão diferentes. Eu me esforçava para pensar assim, apesar da minha melhor amiga ser loira de olhos azuis, mas eu fingia não ver.
As coisas começaram a mudar rapidamente quando minha irmã caçula nasceu.
Eu me chamava e me chamo Lusia, um nome que hoje se encontrou com minha faixa etária, mas com 7 anos, era um nome de senhora e eu não gostava dele.
Minha irmã se chamou e se chama Laís. O nome mais lindo e sonoro e feminino do mundo.
Para ajudar a piorar era o bebe mais lindo que conheci naquela época e fiquei ainda mais feia me comparando a ela. Cabelo mais claro, pele mais morena, olhar profundo, bochecha que convidava aos apertões. Sorriso também banguela, mas nela até ser banguela era bonito!
Naquela época eu não pensei que era o máximo ter uma irmã caçula tão fofa e linda e querida por todos, eu apenas tinha ciúmes.
Na escola, outro capítulo. Todos tinham a mesma idade que eu e eram mais bonitos.
Com exceção de uma menina que se chamava Joana à qual me afeiçoei muito, todos eram mais bonitos.
Joana era a mais feia, a mais pobre, a que tinha mais problemas de aprendizado e talvez por isso eu tenha tido compaixão. Ou talvez, porque ela era a única que me mostrava que sim, que tudo podia ser pior.
Então, já que era assim e eu nada podia fazer decidi ser a melhor da classe. Para meu sofrimento solitário. Não era muito difícil, eu lia e escrevia bem, gostava de fazer a lição (tarefa!), prestava muita atenção, mas quase morri de chorar quando tirei 98 e não 100, mesmo o 98 tendo sido a nota mais alta da classe e tendo recebido parabéns da Dona Terezinha, minha primeira professora, porque não fiz pré, fui direto ao primeiro ano.
Quer sofrimento mais inútil do que esse?
Mas aos 7 anos eu ainda não sabia!
quinta-feira, 21 de maio de 2009
Achamos Skol
Quem tem amigo tem tudo. Quem tem amiga então, tá feito na vida.
Minha amiga Thelma me enviou o link onde podemos ver Danilo Gentili em seu momento stand up comedy falando de futebol. Redondo é rir da vida é mais que uma campanha, é um projeto em que eu queria ter trabalhado. Não só porque é brilhante, mas porque tenho certeza de que o time (não o de futebol, o de profissionais) comemorou com uma Skol gelada!
Have fun!
http://www.redondoerirdavida.com.br
Minha amiga Thelma me enviou o link onde podemos ver Danilo Gentili em seu momento stand up comedy falando de futebol. Redondo é rir da vida é mais que uma campanha, é um projeto em que eu queria ter trabalhado. Não só porque é brilhante, mas porque tenho certeza de que o time (não o de futebol, o de profissionais) comemorou com uma Skol gelada!
Have fun!
http://www.redondoerirdavida.com.br
quarta-feira, 20 de maio de 2009
Histórias de Recife II
Na época em que morei em Recife ir à praia todo final de semana era uma novidade.
Gosto muito de mato, mas estar ali, a algumas quadras da praia, com aquele sol delicioso não me deixava muita opção, nem muita saudade do mato.
Era um gostoso ritual, novos amigos todo final de semana.
Como qualquer pernambucana da gema não tardei em fazer amizade com o dono e a dona do carrinho de cachorro-quente mais próximo de onde eu acampava. Se é que o período das 8h00 às 10h00 pode ser chamado de acampamento...
José e Maria. Mais original impossível! Eu tinha conta e pagava por mês o consumo de água e cachorro quente, é claro!
Gente boníssima. Pele morena curtida de sol. Sorriso farto. Gestos largos para chamar atenção.
Caprichosos em tudo. Preocupados com minha situação de eterna galega estrangeira, recomendações e cuidados.
Um sábado qualquer chego e não encontro Maria. Pergunto ao José e ele responde com uma naturalidade surpreendente:
- foi pra Nova Iorque, só vem semana que vem
E eu:
- uau! que legal! e lá sentada em meu canto fofo de areia, cheia dos apetrechos, protetor solar, protetor labial, chapeú, garrafa d´água, penso com as cordinhas do meu biquini - e não é que esse negócio de vender cachorro quente na praia dá dinheiro? ma rapaiz, olhe só onde tá a Maria, como será que ela tá se virando? será que ela fala inglês? será que foi com algum turista que conheceu aqui? E perco-me em divagações até ser cercada pelo habitual grupo de amigos e falar de coisas que já não me lembro mais.
Semana seguinte, chego curiosa querendo saber das novidades da Maria e pergunto:
- Maria, e que tal Nova Iorque? Como foi?
- ah, bem, eu vou sempre lá, é que mainha tá doente e demorei mais, cheguei inda agorinha
- ?!?!
Ela, percebendo minha cara de não estou entendo nada, caiu na risada e completou:
- Ah, tava achando que eu tava lá nos Estados Unidos né? Tava não, Nova Iorque é uma cidadezinha que tem aqui mesmo, pertinho do Recife!
E lá foi serelepe e sorridente atender um freguês menos inocente do que eu!
Gosto muito de mato, mas estar ali, a algumas quadras da praia, com aquele sol delicioso não me deixava muita opção, nem muita saudade do mato.
Era um gostoso ritual, novos amigos todo final de semana.
Como qualquer pernambucana da gema não tardei em fazer amizade com o dono e a dona do carrinho de cachorro-quente mais próximo de onde eu acampava. Se é que o período das 8h00 às 10h00 pode ser chamado de acampamento...
José e Maria. Mais original impossível! Eu tinha conta e pagava por mês o consumo de água e cachorro quente, é claro!
Gente boníssima. Pele morena curtida de sol. Sorriso farto. Gestos largos para chamar atenção.
Caprichosos em tudo. Preocupados com minha situação de eterna galega estrangeira, recomendações e cuidados.
Um sábado qualquer chego e não encontro Maria. Pergunto ao José e ele responde com uma naturalidade surpreendente:
- foi pra Nova Iorque, só vem semana que vem
E eu:
- uau! que legal! e lá sentada em meu canto fofo de areia, cheia dos apetrechos, protetor solar, protetor labial, chapeú, garrafa d´água, penso com as cordinhas do meu biquini - e não é que esse negócio de vender cachorro quente na praia dá dinheiro? ma rapaiz, olhe só onde tá a Maria, como será que ela tá se virando? será que ela fala inglês? será que foi com algum turista que conheceu aqui? E perco-me em divagações até ser cercada pelo habitual grupo de amigos e falar de coisas que já não me lembro mais.
Semana seguinte, chego curiosa querendo saber das novidades da Maria e pergunto:
- Maria, e que tal Nova Iorque? Como foi?
- ah, bem, eu vou sempre lá, é que mainha tá doente e demorei mais, cheguei inda agorinha
- ?!?!
Ela, percebendo minha cara de não estou entendo nada, caiu na risada e completou:
- Ah, tava achando que eu tava lá nos Estados Unidos né? Tava não, Nova Iorque é uma cidadezinha que tem aqui mesmo, pertinho do Recife!
E lá foi serelepe e sorridente atender um freguês menos inocente do que eu!
terça-feira, 19 de maio de 2009
Procura-se comercial da Skol
Estava lá no sofá da sala, televisão ligada enquanto me concentro em livros, revistas, leio email pelo celular. Sou espetada por um brinquedo esquecido embaixo da almofada, tropeço em outro, e a televisão lá, esforçando-se para chamar minha atenção, quando de repente ela consegue.
Começa com uma voz masculina, sotaque caipira como o meu. Ponto para ele, tive que olhar. E aí, para que eu não desistisse, ele continuou, sozinho, falando sobre futebol. Já sabem que é um tema que me interessa, acompanhei o raciocínio e pra fechar com chave de ouro, ele me fala da cerveja Skol. Eu não tomo Skol, mas tomo cerveja. Porque não tomo Skol? Se esse cara fala comigo, do jeito que eu entendo porta e verde e nunca poderia ter um filho chamado Bernardo porque daria um nó na minha língua, apesar de achar o nome muito bonito?
Ele fala tudo o que sempre observo. Moças que não querem decepcionar os namorados assistem futebol e comentam: ai, se entra é gol! Ele não se refere as moças, é delicado, mas estamos conectados e entendo a mensagem.
E já conquistada pelo comercial de cerveja mais bacana que já vi nos últimos tempos ele finaliza mais ou menos assim:
- corintianos são os únicos que respeitam o juiz, eles dizem, meretíssimo, eu sou inocente...
Não que eu queira causar polêmica entre as torcidas, estou apenas relatando a minha grata surpresa com um comercial de cerveja que não tem nenhuma mulher sem roupa, não tem uma roda de amigos, o sotaque não é carioca, não tem praia e mesmo assim é espetacular! Mas, não encontrei o link desse filme nem no site da F/Nazca. Será que eu vi mesmo esse filme? Alguém viu esse filme por aí?
Começa com uma voz masculina, sotaque caipira como o meu. Ponto para ele, tive que olhar. E aí, para que eu não desistisse, ele continuou, sozinho, falando sobre futebol. Já sabem que é um tema que me interessa, acompanhei o raciocínio e pra fechar com chave de ouro, ele me fala da cerveja Skol. Eu não tomo Skol, mas tomo cerveja. Porque não tomo Skol? Se esse cara fala comigo, do jeito que eu entendo porta e verde e nunca poderia ter um filho chamado Bernardo porque daria um nó na minha língua, apesar de achar o nome muito bonito?
Ele fala tudo o que sempre observo. Moças que não querem decepcionar os namorados assistem futebol e comentam: ai, se entra é gol! Ele não se refere as moças, é delicado, mas estamos conectados e entendo a mensagem.
E já conquistada pelo comercial de cerveja mais bacana que já vi nos últimos tempos ele finaliza mais ou menos assim:
- corintianos são os únicos que respeitam o juiz, eles dizem, meretíssimo, eu sou inocente...
Não que eu queira causar polêmica entre as torcidas, estou apenas relatando a minha grata surpresa com um comercial de cerveja que não tem nenhuma mulher sem roupa, não tem uma roda de amigos, o sotaque não é carioca, não tem praia e mesmo assim é espetacular! Mas, não encontrei o link desse filme nem no site da F/Nazca. Será que eu vi mesmo esse filme? Alguém viu esse filme por aí?
segunda-feira, 18 de maio de 2009
O alto custo do preço baixo
Nem sempre conseguimos ir às compras sem as crianças. É sempre uma experiência e uma rica fonte de estudos.
Cobasi, comprando ração para o cachorro, biscoitos e outros apetrechos mais, as meninas se uniram para nos convencer a levar uns hamsters. Entre pensar, decidir, visualizar o que seria o cotidiano compartilhado com essas criaturinhas, o preço tem peso importante e qual não foi nossa surpresa: R$ 2,00. Isso mesmo, dois reais cada um dos roedores. Vamos levar dois.
Bom, o alto custo do preço baixo foi sentido em seguida quando fomos comprar o enxoval...
Gaiola. Escolhi um modelo mais bonitinho porque sabia que ficaria dentro de casa e apelei para o senso de design do papai. R$ 145,00. Perdi o senso de proporção. E lá se foram outros tantos reais em comedor, bebedouro, serragem, comida, pó para banho seco, roedor e outros tantos apetrechos.
Escolheram os bichinhos de pelagem tão parecida que ninguém sabia ao certo quem era dona de quem e a confusão começou.
Dois machos para evitar procriação, porque são mais tranquilos que as fêmeas e pelo amor da preservação do nosso lar! Mas, o rapaz bem informado não nos contou que dois machos vivem pouco tempo em um mesmo ambiente e diante da primeira briga, quase fatal, nova gaiola foi comprada. Igual! Mais R$ 145,00 e não mais por senso estético, simplesmente porque as meninas não queriam o seu hamster em uma gaiola mais simples.
Tempo estimado de vida: 2 anos.
Mas a cada 2 dias, papai ou mamãe limpando a gaiola, água fresca, comida todo dia.
Viagem? Cuidados especias, comida estrategicamente colocada.
Tiveram vários nomes, mas nunca responderam a nenhum.
Um dia, um deles apareceu doente, com um tumor perto da orelhinha. Tão parecidos que minha primogênita logo convenceu a todos que aquele não era o dela.
Quem tomou aos seus cuidados, cuida. E lá vamos nós a um veterinário especializado em animais silvestres.
R$ 75,00 a consulta. Dá para operar, R$ 250,00, mas ele pode morrer, muito frágil e já com um ano e meio de seus estimados 2 anos de vida.
Eu disse não a operação, quase contrariando o resto da familia, mas levamos para casa uma porção de pomadas, remédio para limpeza, vitamina para a água e ele teve uma sobrevida de quase um mês.
Com uma gaiola desocupada facilitou a troca, a limpeza.
Aí chegaram os peixes. Lembrança de uma festa de aniversário. Não compramos nada além de comida. Cada qual segue vivendo em seu humilde aquário no qual chegou.
Sábado encontramos o espanhol morto em sua gaiola. Quando seu companheiro se foi, o nome espanhol foi adotado e nunca mais mudou. Estava deitadinho, como quem se prepara para um fim tranquilo. Tinha água, tinha comida, mas ele se foi. Enterramos no jardim.
Ontem fez uma semana que a minha caçula salvou o rei arthur da amanda (rei arthur = rolinha, amanda = gata) e ele ainda não pode voar, a asa não está totalmente curada.
Para essa eu não quero comprar uma gaiola, quero comprar comida e remedinhos e depois vê-la voando no céu de um azul quase impossível de reproduzir. Cada bichinho tem o seu destino e cada um de nós tem um nó pra desfazer antes de seguir.
Cobasi, comprando ração para o cachorro, biscoitos e outros apetrechos mais, as meninas se uniram para nos convencer a levar uns hamsters. Entre pensar, decidir, visualizar o que seria o cotidiano compartilhado com essas criaturinhas, o preço tem peso importante e qual não foi nossa surpresa: R$ 2,00. Isso mesmo, dois reais cada um dos roedores. Vamos levar dois.
Bom, o alto custo do preço baixo foi sentido em seguida quando fomos comprar o enxoval...
Gaiola. Escolhi um modelo mais bonitinho porque sabia que ficaria dentro de casa e apelei para o senso de design do papai. R$ 145,00. Perdi o senso de proporção. E lá se foram outros tantos reais em comedor, bebedouro, serragem, comida, pó para banho seco, roedor e outros tantos apetrechos.
Escolheram os bichinhos de pelagem tão parecida que ninguém sabia ao certo quem era dona de quem e a confusão começou.
Dois machos para evitar procriação, porque são mais tranquilos que as fêmeas e pelo amor da preservação do nosso lar! Mas, o rapaz bem informado não nos contou que dois machos vivem pouco tempo em um mesmo ambiente e diante da primeira briga, quase fatal, nova gaiola foi comprada. Igual! Mais R$ 145,00 e não mais por senso estético, simplesmente porque as meninas não queriam o seu hamster em uma gaiola mais simples.
Tempo estimado de vida: 2 anos.
Mas a cada 2 dias, papai ou mamãe limpando a gaiola, água fresca, comida todo dia.
Viagem? Cuidados especias, comida estrategicamente colocada.
Tiveram vários nomes, mas nunca responderam a nenhum.
Um dia, um deles apareceu doente, com um tumor perto da orelhinha. Tão parecidos que minha primogênita logo convenceu a todos que aquele não era o dela.
Quem tomou aos seus cuidados, cuida. E lá vamos nós a um veterinário especializado em animais silvestres.
R$ 75,00 a consulta. Dá para operar, R$ 250,00, mas ele pode morrer, muito frágil e já com um ano e meio de seus estimados 2 anos de vida.
Eu disse não a operação, quase contrariando o resto da familia, mas levamos para casa uma porção de pomadas, remédio para limpeza, vitamina para a água e ele teve uma sobrevida de quase um mês.
Com uma gaiola desocupada facilitou a troca, a limpeza.
Aí chegaram os peixes. Lembrança de uma festa de aniversário. Não compramos nada além de comida. Cada qual segue vivendo em seu humilde aquário no qual chegou.
Sábado encontramos o espanhol morto em sua gaiola. Quando seu companheiro se foi, o nome espanhol foi adotado e nunca mais mudou. Estava deitadinho, como quem se prepara para um fim tranquilo. Tinha água, tinha comida, mas ele se foi. Enterramos no jardim.
Ontem fez uma semana que a minha caçula salvou o rei arthur da amanda (rei arthur = rolinha, amanda = gata) e ele ainda não pode voar, a asa não está totalmente curada.
Para essa eu não quero comprar uma gaiola, quero comprar comida e remedinhos e depois vê-la voando no céu de um azul quase impossível de reproduzir. Cada bichinho tem o seu destino e cada um de nós tem um nó pra desfazer antes de seguir.
sexta-feira, 15 de maio de 2009
Chuva e Sol
Choveu a noite toda.
Amanheceu chovendo.
As pessoas escrevem sobre a chuva. Algumas reclamam. Outras nem se dão ao trabalho.
O noticiário invade a nossa casa e quando a chuva cai as notícias nunca são muito boas.
Mas eu gosto da chuva.
Choveu no dia 27 de abril, uma segunda-feira, dia antes do meu nascimento. Deus lavou o mundo para me receber.
Choveu no dia em que desci correndo uma rua da vila mariana, de mão dada com o meu amigo que já se foi.
Sempre chove quando estou na estrada estreita que nos leva de Presidente Prudente a São José do Rio Preto.
Choveu quando eu soube que tinha sido aprovada no vestibular.
Choveu quando eu decidi que ia mesmo amar e me casar e ter filhos e uma vida regrada.
Mas agora parou de chover e enquanto penso em algo para escrever minha caçula grita:
- mãe, vem ver o seu quarto está amarelo por causa do sol
Lindo, discreto, ele não esperava ser descoberto quando convenceu a cortina azul a deixá-lo entrar.
Será que procurava por mim? Será que estava pronto a me revelar um segredo?
Será que vinha libertar a ansiedade que aprisiono para ultrapassar mais um final de semana sem notícias?
Olho as abas do meu navegador e tudo está conectado.
O sol já escapou, encabulado que ficou.
A minha pequena já escolheu um dvd e se aninhou no sofá.
Eu queria um jeito mais tranquilo de terminar, mas prometi que já ia descer e não vou decepcionar. Não, eu não!
Amanheceu chovendo.
As pessoas escrevem sobre a chuva. Algumas reclamam. Outras nem se dão ao trabalho.
O noticiário invade a nossa casa e quando a chuva cai as notícias nunca são muito boas.
Mas eu gosto da chuva.
Choveu no dia 27 de abril, uma segunda-feira, dia antes do meu nascimento. Deus lavou o mundo para me receber.
Choveu no dia em que desci correndo uma rua da vila mariana, de mão dada com o meu amigo que já se foi.
Sempre chove quando estou na estrada estreita que nos leva de Presidente Prudente a São José do Rio Preto.
Choveu quando eu soube que tinha sido aprovada no vestibular.
Choveu quando eu decidi que ia mesmo amar e me casar e ter filhos e uma vida regrada.
Mas agora parou de chover e enquanto penso em algo para escrever minha caçula grita:
- mãe, vem ver o seu quarto está amarelo por causa do sol
Lindo, discreto, ele não esperava ser descoberto quando convenceu a cortina azul a deixá-lo entrar.
Será que procurava por mim? Será que estava pronto a me revelar um segredo?
Será que vinha libertar a ansiedade que aprisiono para ultrapassar mais um final de semana sem notícias?
Olho as abas do meu navegador e tudo está conectado.
O sol já escapou, encabulado que ficou.
A minha pequena já escolheu um dvd e se aninhou no sofá.
Eu queria um jeito mais tranquilo de terminar, mas prometi que já ia descer e não vou decepcionar. Não, eu não!
quinta-feira, 14 de maio de 2009
Mirinda
Conheci uma índia chamada Mirinda.
Claro que, morando em uma cidade chamada Tupã, não causa espanto a ninguém que eu a tenha conhecido.
Mas ela estava incorporada à vida da cidade porque naquela época — hoje já não sei — mas naquela época ainda haviam tribos nos arredores da cidade.
Era sempre um acontecimento, apesar de acontecer todo sábado, a vinda de grupos deles para as compras na cidade.
Alguns se pintavam, as mulheres olhavam curiosas, sorrisos tímidos, crianças nos braços ou arrastadas pelos caminhos. E no caminho de volta, muitos deles se perdiam embriagados pelas calçadas.
Mas Mirinda não. Ela estava incorporada à vida da cidade porque seu filho Otávio não era filho de índio, mas filho de branco. De um branco que além dela ninguém conheceu.
Ele trabalhava em uma gráfica e moravam os dois em um cômodo no fundo do prédio.
Otávio era amigo de meu irmão e eu não perdia a chance de olhar para ele como se fosse um mistério a ser desvendado e muito menos a chance de conversar com ela. Tinha uma voz arrastada, uma dicção comprometida e eu não entendia muita coisa, mas fazia de tudo para que me contasse coisas do trabalho de Otávio porque me divertia muito ouvindo Mirinda dizer pepel em vez de papel.
Mirinda morreu velha encolhida em sua pele morena. De Otávio não sei.
Mas ela teve um pepel importante na minha infância ensinando-me que gente é de qualquer matéria, de qualquer tribo e de qualquer cor.
Claro que, morando em uma cidade chamada Tupã, não causa espanto a ninguém que eu a tenha conhecido.
Mas ela estava incorporada à vida da cidade porque naquela época — hoje já não sei — mas naquela época ainda haviam tribos nos arredores da cidade.
Era sempre um acontecimento, apesar de acontecer todo sábado, a vinda de grupos deles para as compras na cidade.
Alguns se pintavam, as mulheres olhavam curiosas, sorrisos tímidos, crianças nos braços ou arrastadas pelos caminhos. E no caminho de volta, muitos deles se perdiam embriagados pelas calçadas.
Mas Mirinda não. Ela estava incorporada à vida da cidade porque seu filho Otávio não era filho de índio, mas filho de branco. De um branco que além dela ninguém conheceu.
Ele trabalhava em uma gráfica e moravam os dois em um cômodo no fundo do prédio.
Otávio era amigo de meu irmão e eu não perdia a chance de olhar para ele como se fosse um mistério a ser desvendado e muito menos a chance de conversar com ela. Tinha uma voz arrastada, uma dicção comprometida e eu não entendia muita coisa, mas fazia de tudo para que me contasse coisas do trabalho de Otávio porque me divertia muito ouvindo Mirinda dizer pepel em vez de papel.
Mirinda morreu velha encolhida em sua pele morena. De Otávio não sei.
Mas ela teve um pepel importante na minha infância ensinando-me que gente é de qualquer matéria, de qualquer tribo e de qualquer cor.
quarta-feira, 13 de maio de 2009
Lateborns
Frank Sulloway é um pesquisador do Massachusetts Institute of Technology que fez um grande estudo sobre a influência da ordem de nascimento — primogênito, caçula, do meio — no comportamento das pessoas. Algumas conclusões fazem sentido, outras são mais questionáveis. Quando olho para o meu universo nem todos os pingos estão sobre os is da narrativa.
As famílias diminuíram muito. Muitos são filhos únicos. Não há nada de errado com isso. Eu apenas sinto pena da história. A história da família se perde quando ela envelhece e quando um ou outro se vai. Quando se tem pelo menos um irmão há sempre uma história: você era o preferido da mamãe, você quebrou meu nariz, é porque você quebrou meu carrinho. Você escondia o bife embaixo do arroz para ganhar outro, é e você cuspia a abóbora no guardanapo e por aí vai.
Ontem, preparando as crianças para dormir o papai disse para a primogênita:
- vou te ensinar a arrumar a sua cama, com a sua idade eu já fazia isso
Ajudei:
- e eu também! E insisti:
- e a sua priminha já arruma a cama, sabe lavar louça, até cozinha
E ela já preocupada:
- ah, mas é bem mais velha!
E eu:
- ah, mas faz isso há muito tempo!
E ela:
- ah, mas é filha única!
A arte da argumentação que cultivamos em minha casa às vezes é de matar! Mas vamos lá, eu retruquei:
- ah, mas eu com a sua idade fazia tudo isso, menos cozinhar, e tinha quatro irmãos!
No que minha caçula nos interrompe curiosa:
- e o que aconteceu com eles?
- nada, crescemos todos e hoje eles são seu tio e tias!
Nossa lição doméstica encerrou-se com uma lição de tempo verbal.
Papai leu mais um capítulo do livro do momento porque, mais do que uma rotina, é o que alimenta a alma enquanto as histórias vão sendo construídas.
As famílias diminuíram muito. Muitos são filhos únicos. Não há nada de errado com isso. Eu apenas sinto pena da história. A história da família se perde quando ela envelhece e quando um ou outro se vai. Quando se tem pelo menos um irmão há sempre uma história: você era o preferido da mamãe, você quebrou meu nariz, é porque você quebrou meu carrinho. Você escondia o bife embaixo do arroz para ganhar outro, é e você cuspia a abóbora no guardanapo e por aí vai.
Ontem, preparando as crianças para dormir o papai disse para a primogênita:
- vou te ensinar a arrumar a sua cama, com a sua idade eu já fazia isso
Ajudei:
- e eu também! E insisti:
- e a sua priminha já arruma a cama, sabe lavar louça, até cozinha
E ela já preocupada:
- ah, mas é bem mais velha!
E eu:
- ah, mas faz isso há muito tempo!
E ela:
- ah, mas é filha única!
A arte da argumentação que cultivamos em minha casa às vezes é de matar! Mas vamos lá, eu retruquei:
- ah, mas eu com a sua idade fazia tudo isso, menos cozinhar, e tinha quatro irmãos!
No que minha caçula nos interrompe curiosa:
- e o que aconteceu com eles?
- nada, crescemos todos e hoje eles são seu tio e tias!
Nossa lição doméstica encerrou-se com uma lição de tempo verbal.
Papai leu mais um capítulo do livro do momento porque, mais do que uma rotina, é o que alimenta a alma enquanto as histórias vão sendo construídas.
terça-feira, 12 de maio de 2009
Teste
Ele precisava interpretar ele mesmo mas não sabia como.
Acostumado que estava a representar o cara feliz. O cara que se dá bem na balada. O cara que sempre tem uma mulher bonita para quem ligar. O cara dos aparatos tecnológicos, o cara plugado. O cara moderno, o cara bem relacionado, o cara que sempre está na lista dos convidados. O cara do carro do ano, o cara que sabe andar de moto, de skate, de bicicleta, de jetski, de barco. O cara que sempre sai sorrindo nas fotos de galera.
É, mas agora é pra valer e ele não sabe como se comportar.
Sentado no silêncio da sala branca, um quadro torto na parede o encara sem piedade e faz um monte de perguntas que ele não sabe responder.
Disfarçando tenta buscar na memória uma dica de quem ele é fora do seu contexto de ter. Mas sem muito resultado.
No caminho ouviu no rádio do carro um anúncio da Livraria Cultura: ler para ser. Começar por aí? Procurou uma revista, mas não encontrou. Apertou botões no celular, mas não conectou.
Respirou fundo e resignado entregou-se à espera.
Acostumado que estava a representar o cara feliz. O cara que se dá bem na balada. O cara que sempre tem uma mulher bonita para quem ligar. O cara dos aparatos tecnológicos, o cara plugado. O cara moderno, o cara bem relacionado, o cara que sempre está na lista dos convidados. O cara do carro do ano, o cara que sabe andar de moto, de skate, de bicicleta, de jetski, de barco. O cara que sempre sai sorrindo nas fotos de galera.
É, mas agora é pra valer e ele não sabe como se comportar.
Sentado no silêncio da sala branca, um quadro torto na parede o encara sem piedade e faz um monte de perguntas que ele não sabe responder.
Disfarçando tenta buscar na memória uma dica de quem ele é fora do seu contexto de ter. Mas sem muito resultado.
No caminho ouviu no rádio do carro um anúncio da Livraria Cultura: ler para ser. Começar por aí? Procurou uma revista, mas não encontrou. Apertou botões no celular, mas não conectou.
Respirou fundo e resignado entregou-se à espera.
segunda-feira, 11 de maio de 2009
Delicado
Ontem minha caçula chegou correndo da casa de um amigo, tinha sido chamada para o banho, mas chamou-me de lado e confidenciou:
- mãe, eu tenho um segredão!
Não posso negar, sempre me dá um frio na barriga, mas esperei pacientemente e ela, apesar de estarmos sozinhas, quis que eu me abaixasse para dizer ao pé do ouvido:
- eu trouxe o rei arthur...
- quem é o rei arthur? onde ele está?
- está no banco da varanda, é um passarinho!
- um passarinho? já descendo rápido as escadas
- é, eu e meu amigo salvamos, a amanda estava com ele na boca
A amanda é a gata siamesa mais vira-lata que anda pelo condomínio. É uma dos cinco bichanos da casa do amigo.
E não é que lá no banco, resignado, sem se mexer, esperava por nós o rei arthur?
Sorte dele não ter sido a minha caçula seguida pela amanda, que anda lá pelos arredores da nossa casa e já destruiu um ninho de passarinhos na minha garagem sem a menor cerimonia.
Não sei se é rei ou rainha, mas o recolhemos. Preparamos em um recipiente de acrílico que já foi um aquário uma base com serragem, pote com água, pote com aveia e biscoito de gergelim e à noite, cobrimos o rei arthur para que dormisse mais aconchegado.
É da natureza da amanda caçar.
É da natureza da pombinha do ar voar, ser livre, mas filhote, teve o azar de conhecer amanda, para depois ter a sorte de conhecer o gesto delicado das crianças e da minha pequena, que quando crescer vai ser dona de zoológico. Já começou bem, tem gestos delicados.
- mãe, eu tenho um segredão!
Não posso negar, sempre me dá um frio na barriga, mas esperei pacientemente e ela, apesar de estarmos sozinhas, quis que eu me abaixasse para dizer ao pé do ouvido:
- eu trouxe o rei arthur...
- quem é o rei arthur? onde ele está?
- está no banco da varanda, é um passarinho!
- um passarinho? já descendo rápido as escadas
- é, eu e meu amigo salvamos, a amanda estava com ele na boca
A amanda é a gata siamesa mais vira-lata que anda pelo condomínio. É uma dos cinco bichanos da casa do amigo.
E não é que lá no banco, resignado, sem se mexer, esperava por nós o rei arthur?
Sorte dele não ter sido a minha caçula seguida pela amanda, que anda lá pelos arredores da nossa casa e já destruiu um ninho de passarinhos na minha garagem sem a menor cerimonia.
Não sei se é rei ou rainha, mas o recolhemos. Preparamos em um recipiente de acrílico que já foi um aquário uma base com serragem, pote com água, pote com aveia e biscoito de gergelim e à noite, cobrimos o rei arthur para que dormisse mais aconchegado.
É da natureza da amanda caçar.
É da natureza da pombinha do ar voar, ser livre, mas filhote, teve o azar de conhecer amanda, para depois ter a sorte de conhecer o gesto delicado das crianças e da minha pequena, que quando crescer vai ser dona de zoológico. Já começou bem, tem gestos delicados.
sexta-feira, 8 de maio de 2009
Aristocracia
Tenho um amigo naturalmente filósofo, inteligente, de humor refinado e ao alcance de poucos.
Foi o primeiro a notar e mais, a questionar: esse seu nariz empinado, essa sua pose de princesa, de sinhazinha, de onde foi mesmo que tirou? E completava vez ou outra:
- é certo que quem vestiu seda sempre traz retalho...
Mas não vesti. Não cresci em uma família quatrocentona de São Paulo, nem entre as riquezas do leite e diamantes de Minas Gerais.
E quando penso em meu relacionamento com a comida, nem um retalho de seda pode servir como toalha ou guardanapo porque não há nenhum refinamento.
Gosto de arroz e feijão, com bife bem fininho (mas não paillard!) e salada de alface sem muito tempero. E gosto de carne moída, bem temperada com salsinha e tomate. Abobrinha refogada.
Salada de chuchu bem gelada no verão. Meu pai dizia que chuchu é metade água e metade chuva mas muito bom para a pressão alta.
E gosto de costela para horror de muitos e torresmo bem pequenino e crocante. E bife de fígado bem acebolado. Gosto da coxa do frango com batatas. E não gosto muito de tomate a não ser que seja a base, aquela parte gordinha, sem sementes. E nem de cenoura ralada ou suco de beterraba. Como para dar bom exemplo as crianças, mas não com o mesmo prazer com que como arroz, feijão e milho refogado. Gosto de carne seca com abóbora. Mas do ovo eu só gosto da clara, seja frito ou cozido.
Não gosto de alcaparras, não como escargot, não como frutos do mar.
Mas adoro rúcula, agrião, almeirão cortado bem fininho, como só a minha mãe sabe cortar.
E, como sou muito caipira, eu prefiro preparar um único prato, com tudo o que eu vou comer de uma única vez. Mas, como sou uma caipira cosmopolita, eu topo começar pela salada para depois comer o quente, às vezes.
E troco um chocolate delicado, na sobremesa, por um bom quindim ou um pedaço de pudim de leite ou mesmo um bolo de milho bem úmido com côco.
Não sei se, para minha sorte ou para meu azar, eu como muito pouco por pura falta de espaço físico e então, tenho que fazer trade-off: se a sobremesa for muito boa, o prato principal terá que ser menor, ou precisarei de um intervalo de umas duas horas. E é muito raro que eu consiga tomar o café para fechar a refeição.
Podem achar que tudo parece simples e natural, até o dia em que eu tiver coragem de contar como me relacionei com o prato servido pelo chef do rei da Espanha.
Foi o primeiro a notar e mais, a questionar: esse seu nariz empinado, essa sua pose de princesa, de sinhazinha, de onde foi mesmo que tirou? E completava vez ou outra:
- é certo que quem vestiu seda sempre traz retalho...
Mas não vesti. Não cresci em uma família quatrocentona de São Paulo, nem entre as riquezas do leite e diamantes de Minas Gerais.
E quando penso em meu relacionamento com a comida, nem um retalho de seda pode servir como toalha ou guardanapo porque não há nenhum refinamento.
Gosto de arroz e feijão, com bife bem fininho (mas não paillard!) e salada de alface sem muito tempero. E gosto de carne moída, bem temperada com salsinha e tomate. Abobrinha refogada.
Salada de chuchu bem gelada no verão. Meu pai dizia que chuchu é metade água e metade chuva mas muito bom para a pressão alta.
E gosto de costela para horror de muitos e torresmo bem pequenino e crocante. E bife de fígado bem acebolado. Gosto da coxa do frango com batatas. E não gosto muito de tomate a não ser que seja a base, aquela parte gordinha, sem sementes. E nem de cenoura ralada ou suco de beterraba. Como para dar bom exemplo as crianças, mas não com o mesmo prazer com que como arroz, feijão e milho refogado. Gosto de carne seca com abóbora. Mas do ovo eu só gosto da clara, seja frito ou cozido.
Não gosto de alcaparras, não como escargot, não como frutos do mar.
Mas adoro rúcula, agrião, almeirão cortado bem fininho, como só a minha mãe sabe cortar.
E, como sou muito caipira, eu prefiro preparar um único prato, com tudo o que eu vou comer de uma única vez. Mas, como sou uma caipira cosmopolita, eu topo começar pela salada para depois comer o quente, às vezes.
E troco um chocolate delicado, na sobremesa, por um bom quindim ou um pedaço de pudim de leite ou mesmo um bolo de milho bem úmido com côco.
Não sei se, para minha sorte ou para meu azar, eu como muito pouco por pura falta de espaço físico e então, tenho que fazer trade-off: se a sobremesa for muito boa, o prato principal terá que ser menor, ou precisarei de um intervalo de umas duas horas. E é muito raro que eu consiga tomar o café para fechar a refeição.
Podem achar que tudo parece simples e natural, até o dia em que eu tiver coragem de contar como me relacionei com o prato servido pelo chef do rei da Espanha.
quinta-feira, 7 de maio de 2009
Livros ao acaso
Abri a porta da estante. Tirei livros de prateleiras diversas e os empilhei na mesa próxima.
Sem ordem, sem critério, sem saber exatamente o que encontrar, abri páginas ao acaso e capturei um pedaço do texto.
Um jeito de alimentar a alma. Um jeito de pensar apenas pensamentos alheios. Um jeito de fazer lado esquerdo e direito do cérebro se acalmarem e trabalharem cada um a seu tempo. Um conta quantos trechos e quantos livros quando terminarmos, o outro pode se deleitar com o exercío da humildade. Ninguém escreve impunemente. Então, vamos começar:
[1] Hoje foi a vez de José Donoso. Resistiu quanto pôde à doença, mas chega sempre o momento em que o corpo abandona o espirito à sua sorte.
Cadernos de Lanzarote II — José Saramago
[2] Aquele quarto ficava no andar superior, mas os sapos rodeavam a casa coaxando. Não parecia ser apenas um, pareciam dois ou três pulando, incansáveis em torno da casa. Coaxavam por um longo tempo.
O país das neves — Yasunari Kawabata
[3] "Acaso pode o pesaroso algo mais que o choro? É somente pelo anseio que assim me exponho. Deito-me e parce que a noite diz às estrelas: ´vamos, fiquem aí e não deixem amanhecer´"
Livro das mil e uma noites - vol. 2 — ramo sírio traduzido do árabe por Mamede Mustafa Jarouche
[4] Maria erguera-se, vermelha, dando um jeito rápido aos ganchos do cabelo arranchado à pressa, um pouco desmanchado.
Os Maias — Eça de Queiroz
[5] Preciso encarar minhas origens, assumir os princípios eternos da fé. E, além do mais, isso não é da sua conta, não senhor.
O último suspiro do mouro — Salman Rushdie
[6] De todos modos ya estás deshonrada. Los ricos no aguantan eso. Tu familia debe estar muy contenta de que hayas desaparecido, así no tendrán que echarte a la calle.
Hija de la fortuna — Isabel Allende
[7] Em Paris olhavas as senhoras e acompanhavas a ration studiorum dos epicuristas, ao invés de refletir nos grandes milagres desse nosso Universum, que o Sanctíssimo Nome do seu Creador fiat semper laudato!
A ilha do dia anterior — Umberto Eco
[8] Pôs as calças justas, mas não deu os laços nem colocou no colarinho da camisa o botão de ouro que usava sempre.
Cem anos de solidão — Gabriel Garcia Márquez
[9] Não oblitero moscas com palavras. Uma espécie de canto me ocasiona. Respeito as oralidades.
O livro das ignorãças — Manoel de Barros
[10] Con todo eso - dijo el cura -, por esta vez no le habéis de llevar, ni aun él dejará llevarse, a lo que yo entiendo.
Don Quijote de la mancha — Miguel de Cervantes
[11] Condenado pelo destino à ociosidade permanente, eu não fazia absolutamente nada. Passava horas inteiras a olhar através dos vidros o céu, os pássaros e as alamedas, lia tudo quanto me traziam do correio e dormia. Às vezes, saia e vagava pelas cercanias até tarde da noite.
O violino de Rothschild e outros contos - A casa de mezanino — Tchekhov
[12] O luar é uma lenda de balada Das que avozinhas contam à lareira, E a noite é uma flor de laranjeira que jaz na minha rua desfolhada...
Poemas - Noivado estranho — Florbela Espanca
[13] Ainda que minha vida seja infeliz, os dezessete volumes aí estarão. Aí estará essa espécie de eternidade que são As mil e uma noites do Oriente.
Sete noites — Jorge Luis Borges
[14] Finalmente o namorado da modelo chega. Deslumbrado diante do cabelo tratado com Pu-xam, o cara balbucia: "você cavou o labelo?"
Tão ontem — Scott Westerfeld
[15] Ao abrir a porta, de manhã, ali quietinho na cama o velho Topi se finou dormindo. Tudo o que direi, a quem me perguntar: ah, morrer não é tão fácil.
Dinorá - Tiau Topinho — Dalton Trevisan
[16] É claro que vacilei. Vacilei muitas vezes, mesmo tendo sido preparado para a controvérsia, a privação, a adversidade.
Boca do Inferno — Ana Miranda
[17] "Sei que sua mulher vai dizer sim o ano que vem", disse ele, virando-se para Lin. "Não se preocupe. Vou ajudá-lo a encontrar uma forma de acabar com esse casamento. Agora seja um noivo generoso."
A espera — Ha Jin
[18] Racista, preconceituoso e imprudente, o delegado decidira isolar, como em um gueto, nada menos que setenta por cento da população da cidade.
Corações sujos — Fernando Morais
[19] A propósito, no final de maio, em meio a todos esses incidentes, uma carta chegara à casa dos Makioka via Sibéria, que aproveito para registrar aqui. Era uma carta escrita em inglês, destinada a Sachiko e enviada pela senhora Stolz, que voltara de Manila para Hamburgo.
As Irmãs Makioka — Jun`Ichiro Tanizaki
[20] - Ficou maluco? Não sei como, lancei-lhe na cara uma resposta ofensiva, que deixou todo mundo gelado: - Sim, como sua mulher, que você prefere manter presa num manicômio! Parou na minha frente, pálido e convulso.
Um, nenhum e cem mil — Luigi Pirandello
Lado esquerdo: 20 livros consultados, 20 textos extraídos
Lado direito: vou criar um texto com fragmentos dos fragmentos
[1] Chega sempre o momento, [2] pareciam dois ou três, [3] somente pelo anseio, [4] um pouco desmanchado. [5] Não é da sua conta, [6] de todos modos [7] ao invés de refletir [8] os laços [9] com palavras [10] dejará llevarse.
[11] Condenado pelo destino [12] que jaz na minha rua desfolhada... [13] ainda que minha vida seja infeliz, [14] finalmente [15] tudo o que direi a quem me perguntar: [16] é claro que vacilei.
[17] Não se preocupe. [18] Nada menos que, [19] em meio a todos esses incidentes, [20] uma resposta ofensiva!
Sem ordem, sem critério, sem saber exatamente o que encontrar, abri páginas ao acaso e capturei um pedaço do texto.
Um jeito de alimentar a alma. Um jeito de pensar apenas pensamentos alheios. Um jeito de fazer lado esquerdo e direito do cérebro se acalmarem e trabalharem cada um a seu tempo. Um conta quantos trechos e quantos livros quando terminarmos, o outro pode se deleitar com o exercío da humildade. Ninguém escreve impunemente. Então, vamos começar:
[1] Hoje foi a vez de José Donoso. Resistiu quanto pôde à doença, mas chega sempre o momento em que o corpo abandona o espirito à sua sorte.
Cadernos de Lanzarote II — José Saramago
[2] Aquele quarto ficava no andar superior, mas os sapos rodeavam a casa coaxando. Não parecia ser apenas um, pareciam dois ou três pulando, incansáveis em torno da casa. Coaxavam por um longo tempo.
O país das neves — Yasunari Kawabata
[3] "Acaso pode o pesaroso algo mais que o choro? É somente pelo anseio que assim me exponho. Deito-me e parce que a noite diz às estrelas: ´vamos, fiquem aí e não deixem amanhecer´"
Livro das mil e uma noites - vol. 2 — ramo sírio traduzido do árabe por Mamede Mustafa Jarouche
[4] Maria erguera-se, vermelha, dando um jeito rápido aos ganchos do cabelo arranchado à pressa, um pouco desmanchado.
Os Maias — Eça de Queiroz
[5] Preciso encarar minhas origens, assumir os princípios eternos da fé. E, além do mais, isso não é da sua conta, não senhor.
O último suspiro do mouro — Salman Rushdie
[6] De todos modos ya estás deshonrada. Los ricos no aguantan eso. Tu familia debe estar muy contenta de que hayas desaparecido, así no tendrán que echarte a la calle.
Hija de la fortuna — Isabel Allende
[7] Em Paris olhavas as senhoras e acompanhavas a ration studiorum dos epicuristas, ao invés de refletir nos grandes milagres desse nosso Universum, que o Sanctíssimo Nome do seu Creador fiat semper laudato!
A ilha do dia anterior — Umberto Eco
[8] Pôs as calças justas, mas não deu os laços nem colocou no colarinho da camisa o botão de ouro que usava sempre.
Cem anos de solidão — Gabriel Garcia Márquez
[9] Não oblitero moscas com palavras. Uma espécie de canto me ocasiona. Respeito as oralidades.
O livro das ignorãças — Manoel de Barros
[10] Con todo eso - dijo el cura -, por esta vez no le habéis de llevar, ni aun él dejará llevarse, a lo que yo entiendo.
Don Quijote de la mancha — Miguel de Cervantes
[11] Condenado pelo destino à ociosidade permanente, eu não fazia absolutamente nada. Passava horas inteiras a olhar através dos vidros o céu, os pássaros e as alamedas, lia tudo quanto me traziam do correio e dormia. Às vezes, saia e vagava pelas cercanias até tarde da noite.
O violino de Rothschild e outros contos - A casa de mezanino — Tchekhov
[12] O luar é uma lenda de balada Das que avozinhas contam à lareira, E a noite é uma flor de laranjeira que jaz na minha rua desfolhada...
Poemas - Noivado estranho — Florbela Espanca
[13] Ainda que minha vida seja infeliz, os dezessete volumes aí estarão. Aí estará essa espécie de eternidade que são As mil e uma noites do Oriente.
Sete noites — Jorge Luis Borges
[14] Finalmente o namorado da modelo chega. Deslumbrado diante do cabelo tratado com Pu-xam, o cara balbucia: "você cavou o labelo?"
Tão ontem — Scott Westerfeld
[15] Ao abrir a porta, de manhã, ali quietinho na cama o velho Topi se finou dormindo. Tudo o que direi, a quem me perguntar: ah, morrer não é tão fácil.
Dinorá - Tiau Topinho — Dalton Trevisan
[16] É claro que vacilei. Vacilei muitas vezes, mesmo tendo sido preparado para a controvérsia, a privação, a adversidade.
Boca do Inferno — Ana Miranda
[17] "Sei que sua mulher vai dizer sim o ano que vem", disse ele, virando-se para Lin. "Não se preocupe. Vou ajudá-lo a encontrar uma forma de acabar com esse casamento. Agora seja um noivo generoso."
A espera — Ha Jin
[18] Racista, preconceituoso e imprudente, o delegado decidira isolar, como em um gueto, nada menos que setenta por cento da população da cidade.
Corações sujos — Fernando Morais
[19] A propósito, no final de maio, em meio a todos esses incidentes, uma carta chegara à casa dos Makioka via Sibéria, que aproveito para registrar aqui. Era uma carta escrita em inglês, destinada a Sachiko e enviada pela senhora Stolz, que voltara de Manila para Hamburgo.
As Irmãs Makioka — Jun`Ichiro Tanizaki
[20] - Ficou maluco? Não sei como, lancei-lhe na cara uma resposta ofensiva, que deixou todo mundo gelado: - Sim, como sua mulher, que você prefere manter presa num manicômio! Parou na minha frente, pálido e convulso.
Um, nenhum e cem mil — Luigi Pirandello
Lado esquerdo: 20 livros consultados, 20 textos extraídos
Lado direito: vou criar um texto com fragmentos dos fragmentos
[1] Chega sempre o momento, [2] pareciam dois ou três, [3] somente pelo anseio, [4] um pouco desmanchado. [5] Não é da sua conta, [6] de todos modos [7] ao invés de refletir [8] os laços [9] com palavras [10] dejará llevarse.
[11] Condenado pelo destino [12] que jaz na minha rua desfolhada... [13] ainda que minha vida seja infeliz, [14] finalmente [15] tudo o que direi a quem me perguntar: [16] é claro que vacilei.
[17] Não se preocupe. [18] Nada menos que, [19] em meio a todos esses incidentes, [20] uma resposta ofensiva!
quarta-feira, 6 de maio de 2009
Cães de rua
Não têm raça e quando têm, elas se perdem na sujeira de pelos embolados.
Não têm nome, quem dirá sobrenome. Mas têm um olhar que chega a ser indescritível.
Coleciono imagens de cães que vejo em meus dias movimentados. E que me fazem parar de pensar apenas para olhar.
No canteiro central da Luis Carlos Berrini, quase esquina com a Roberto Marinho, há uma família de cães. Alguém ali da comunidade (porque ninguém desceria de seu carro para isso), preparou uns panos e uma cobertura de madeira porque a cadela tem filhote.
Ele já está crescido e enquanto os adultos confidenciam coisas entre um focinho e outro, ele se diverte em cima da cobertura. Tenho medo de não vê-lo mais por lá, porque traquina como é, pode tentar atravessar a rua achando-se muito poderoso.
Na rotatória da saída do meu condomínio cães faziam ginástica. Um esticando-se pelo chão, outro rolando e correndo como se estivesse em uma academia. De longe, labradores, de perto, raça indefinida.
Na Bandeirantes, pouco antes do km 24, um cão atravessa a passarela tal qual um executivo faria para chegar ao trabalho sem atraso. Passo firme, sem olhar para os lados. Eu, aproveitando que estou de carona, espio atentamente para encontrar o seu humano, mas ele não existe. O cão está só. Decidido, sabe para onde vai. Terá para onde voltar?
São almas em transição diria alguém. São cães que só querem ter a quem querer bem.
Não têm nome, quem dirá sobrenome. Mas têm um olhar que chega a ser indescritível.
Coleciono imagens de cães que vejo em meus dias movimentados. E que me fazem parar de pensar apenas para olhar.
No canteiro central da Luis Carlos Berrini, quase esquina com a Roberto Marinho, há uma família de cães. Alguém ali da comunidade (porque ninguém desceria de seu carro para isso), preparou uns panos e uma cobertura de madeira porque a cadela tem filhote.
Ele já está crescido e enquanto os adultos confidenciam coisas entre um focinho e outro, ele se diverte em cima da cobertura. Tenho medo de não vê-lo mais por lá, porque traquina como é, pode tentar atravessar a rua achando-se muito poderoso.
Na rotatória da saída do meu condomínio cães faziam ginástica. Um esticando-se pelo chão, outro rolando e correndo como se estivesse em uma academia. De longe, labradores, de perto, raça indefinida.
Na Bandeirantes, pouco antes do km 24, um cão atravessa a passarela tal qual um executivo faria para chegar ao trabalho sem atraso. Passo firme, sem olhar para os lados. Eu, aproveitando que estou de carona, espio atentamente para encontrar o seu humano, mas ele não existe. O cão está só. Decidido, sabe para onde vai. Terá para onde voltar?
São almas em transição diria alguém. São cães que só querem ter a quem querer bem.
terça-feira, 5 de maio de 2009
Os gêmeos
Agora gosto de ser única mas quando era criança eu não me bastava e nunca me conformei por não ter uma irmã gêmea.
Minha família não teria sobrevivido a essa carga, a natureza é sábia.
Eu lia tudo sobre gêmeos, quando via um par ou uma dupla ficava enlouquecida e invejava ora secretamente, ora descaradamente e eu nem via tantos assim.
Quando tinha lá os meus 8, 9 anos e morava em Tupã pude testar algumas de minhas insipientes habilidades em suas versões positiva e negativa. Minha persuasão, meu poder de envolver outrem em minha fantasia, minha veia dramática ou minhas mentiras desmacaradas com mão de ferro pela minha mãe. Minha criatividade que agora me dá a chance de rever minhas traquinagens sem um analista de plantão.
O fato é que, ao ser apresentada a uma nova vizinha, não duvidei um só segundo em me apresentar e, encarando os amiguinhos com uma autoridade que não tenho mais, completei:
- ah, e eu tenho uma irmã gêmea, que está fazendo tarefa (não falávamos lição de casa) e logo, logo você deve conhecê-la
O espanto foi geral mas ninguém se atreveu a interferir.
E comecei a minha encenação. Escapava das brincadeiras e corria para casa, mudava de roupa, penteava o cabelo diferente e reaparecia falando de um outro jeito, mais meigo, mais tranquilo, uma menina que eu nunca fui.
É claro que não demorou muito. Dois ou três dias e agora, mais sábia, suspeito que todos fingiam participar da minha farsa e nos divertimos, cada um a seu modo.
Minha mãe não tardou a ralhar comigo com aquele entra e sai e com aquele monte de roupa limpa, suja, que ia se acumulando.
No fim todos concordamos que aquele era um excelente exercício para receber os novos amigos e até elegemos quem seria o próximo gêmeo a recepcionar o novo vizinho. Era democrata! Mas ele tardou a aparecer, as pessoas não se mudavam e deixamos nosso trato de lado.
Os gêmeos ainda me fascinam e a dinâmica de suas vidas, de seus relacionamentos me intriga.
A minha irmã ficou refletida no espelho vermelho e meiga que é, não consegue me dissuadir de contar alguns segredos.
segunda-feira, 4 de maio de 2009
Comercial da Claro
O comercial da Claro me incomoda.
Ele pergunta mais ou menos assim: você conhece alguém que acorda de madrugada sorrindo?
Conhece alguém que trabalha o dia inteiro e quando chega em casa trabalha ainda mais e sorrindo? Então dê um Claro que ela merece.
Bom, definitivamente, por esse conceito, eu jamais ganharei um Claro.
Claro que, como mãe, eu acordo de madrugada. Mas não acordo sorrindo. Acordo bem irritada.
Tenho duas anjinhas que normalmente pedem água, têm medo, querem mais ou menos coberta ou querem apenas ter certeza de que estou por ali.
Mas eu não amo menos ou mais, nem sou amada menos ou mais por não acordar sorrindo.
Vou cambaleando, olhando o relógio, pensando que vou perder preciosos minutos de sono e muitas vezes, quando já ouço o pedido: quero água, um sotaque cantadinho quase mineiro, eu apenas transfiro a missão para o papai. Ele sorri mais que eu. Ele sim mereceria um Claro, mas ninguém faz um comercial assim para o dia dos pais, ou seja, ele também vai ficar sem.
E me incomoda mais ainda a conivência de quem faz que sim, que vai sorrindo, porque ai daquela que não se encaixa! Claro que a Claro sabe que existem muitas assim. Eu mesma conheço uma incapaz de perder a paciência. É admirável, mas não vou sofrer e sorrir.
E outro dia quase fui excomungada porque comentei, naturalmente, que não trato as minhas filhas da mesma forma. Se elas são tão diferentes entre si, como é que eu posso tratar igual? Tratar diferente não é uma divisão entre o bem e o mal, mas estou longe desse inconsciente coletivo e tenho que entender melhor o contexto e escolher melhor minhas palavras, do contrário ficarei no escuro, sem Claro ou qualquer outro presente. O dia das Mães vem aí!
Ele pergunta mais ou menos assim: você conhece alguém que acorda de madrugada sorrindo?
Conhece alguém que trabalha o dia inteiro e quando chega em casa trabalha ainda mais e sorrindo? Então dê um Claro que ela merece.
Bom, definitivamente, por esse conceito, eu jamais ganharei um Claro.
Claro que, como mãe, eu acordo de madrugada. Mas não acordo sorrindo. Acordo bem irritada.
Tenho duas anjinhas que normalmente pedem água, têm medo, querem mais ou menos coberta ou querem apenas ter certeza de que estou por ali.
Mas eu não amo menos ou mais, nem sou amada menos ou mais por não acordar sorrindo.
Vou cambaleando, olhando o relógio, pensando que vou perder preciosos minutos de sono e muitas vezes, quando já ouço o pedido: quero água, um sotaque cantadinho quase mineiro, eu apenas transfiro a missão para o papai. Ele sorri mais que eu. Ele sim mereceria um Claro, mas ninguém faz um comercial assim para o dia dos pais, ou seja, ele também vai ficar sem.
E me incomoda mais ainda a conivência de quem faz que sim, que vai sorrindo, porque ai daquela que não se encaixa! Claro que a Claro sabe que existem muitas assim. Eu mesma conheço uma incapaz de perder a paciência. É admirável, mas não vou sofrer e sorrir.
E outro dia quase fui excomungada porque comentei, naturalmente, que não trato as minhas filhas da mesma forma. Se elas são tão diferentes entre si, como é que eu posso tratar igual? Tratar diferente não é uma divisão entre o bem e o mal, mas estou longe desse inconsciente coletivo e tenho que entender melhor o contexto e escolher melhor minhas palavras, do contrário ficarei no escuro, sem Claro ou qualquer outro presente. O dia das Mães vem aí!
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